SÃO PIO V (05/05)

SÃO PIO V, Papa e Confessor – 3ª classe
Miguel Ghislieri nasceu em 1504, em Bosco, na diocese de Tortona e tomou o hábito de São Domingos aos quatorze anos, no convento de Voghera. Após a ordenação sacerdotal, foi professor de filosofia e teologia durante dezesseis anos. Além disso, ocupou os cargos de mestre de noviços e superior de diversos conventos. Em 1556 foi eleito bispo de Nepi e Sutri e no ano seguinte foi nomeado inquisidor geral e cardeal. Como ele o fazia notar, com certa ironia, esses cargos eram como correntes com as quais a Igreja amarravam seus pés para impedi-lo voltar à paz do claustro.
O Papa Pio IV transferiu-o para a sé piemontesa de Mondovi, que estava praticamente em ruínas devido às guerras. O novo prelado conseguiu, em pouco tempo, restaurar a calma e a prosperidade; mas logo foi chamado a Roma para ocupar outros cargos. Embora as opiniões do Cardeal Ghislieri nem sempre coincidissem com as de Pio IV, ele nunca deixou de expressá-las abertamente.
Pio IV morreu em dezembro de 1565. O Cardeal Ghislieri foi escolhido para sucedê-lo, graças, sobretudo, aos esforços de São Carlos Borromeu, que viu nele o reformador de que a Igreja precisava. Miguel Ghislieri tomou o nome de Pio V. Desde o primeiro momento do seu pontificado, deixou claro que estava determinado a aplicar não só a letra, mas também o seu espírito o Concílio de Trento.
Por ocasião da coroação de um novo Papa, muitas vezes eram distribuídos presentes à multidão; Pio V ordenou que essas dádivas fossem entregues aos pobres nos hospitais e que o dinheiro que se destinava a cobrir as despesas de um banquete que normalmente era oferecido a cardeais, embaixadores e outras altas personalidades fosse distribuído pelos conventos mais necessitados da cidade.
Um dos primeiros decretos do novo Pontífice foi que os bispos residissem nas suas dioceses e os párocos nas suas paróquias, sob pena de severas punições. São Pio V cuidou de purificar a cúria com o mesmo zelo com que acabou com os bandidos nos Estados Pontifícios; promulgou leis contra a prostituição, e proibiu as touradas.
Numa época de escassez, ele importou grandes quantidades de grãos da França e da Sicília e distribuiu a maior parte gratuitamente e o restante foi vendido a um preço abaixo do custo. Determinado a acabar com o nepotismo, manteve os parentes à distância; embora continuando a tradição que tinha de elevar um dos seus sobrinhos ao cardinalato, concedeu-lhe poderes muito reduzidos.
O novo Breviário foi publicado em 1568; nele foram omitidas as festas e legendas extravagantes de alguns santos e as lições da Sagrada Escritura receberam o seu verdadeiro lugar. O novo Missal, surgido dois anos depois, restaurou muitos costumes antigos e adaptou a vida litúrgica às necessidades da época.[1]
A São Pio V a Igreja deve a melhor edição até então feita das obras de São Tomás de Aquino, que foi intitulado Doutor da Igreja pelo próprio Papa. As penas que São Pio V decretava contra as violações da ordem moral eram tão severas que os seus inimigos o acusaram de querer transformar Roma num mosteiro.
O sucesso do Papa deveu-se, em grande parte, à veneração que o povo lhe professava pela sua santidade. Jejuava no Advento e na Quaresma, mesmo nos últimos anos de sua vida, apesar de suas enfermidades. Sua oração era tão fervorosa que o povo garantiu que obteria tudo o que pedisse a Deus.
Ele frequentemente visitava hospitais e ajudava pessoalmente os doentes. As reformas que enumeramos teriam consumido todas as energias de um homem comum; no caso de São Pio V nem sequer eram a sua principal preocupação. Os dois grandes problemas do seu pontificado foram a difusão do protestantismo e as invasões dos turcos.
Contra ambas as ameaças ele trabalhou incansavelmente; deu novo impulso à Inquisição, de modo que o sábio Bayo, cujos escritos foram condenados, só poderia salvar a vida retratando-se. Mas nem todos os sucessos do Papa contra o protestantismo se deveram a métodos tão drásticos, pois, por exemplo, São Pio V converteu um inglês, simplesmente com a santidade e a dignidade que dele transumavam. Durante o seu pontificado, foi concluído o catecismo que o Concílio de Trento mandara escrever e o santo Pontífice ordenou imediatamente que fosse traduzido em várias línguas.
Impôs também aos párocos a obrigação de ministrar instrução religiosa às crianças e aos jovens. Embora São Pio V fosse bastante conservador, estava à frente da maioria dos seus contemporâneos na importância que atribuía à instrução no caso do batismo de adultos.
Os termos que o Pontífice utilizou na reedição da bula “In Caena Domini” (1568) mostraram claramente que, como Papa, defendia uma certa soberania sobre os príncipes. Por muitos anos ele acalentou a esperança de conquistar Isabel da Inglaterra para a fé; mas, em 1570, publicou uma bula de excomunhão contra ela (“Regnans in Excelsis”), pela qual isentava os seus súditos da obrigação de obedecê-la e proibia-os de reconhecê-la como soberana. Isto foi um erro de julgamento, certamente, mas é explicado pela ignorância das reais circunstâncias da Inglaterra e dos sentimentos do povo.
Esta medida apenas aumentou as dificuldades dos católicos ingleses e deu alguma aparência de verdade à acusação de traição tão frequentemente feita contra eles; por outro lado, intensificou as polêmicas sobre juramentos e testes de fidelidade que tanto incomodaram e enfraqueceram os católicos, desde o “Juramento de Obediência” em 1606 até a emancipação em 1829. Ainda hoje, as suspeitas que a bula despertou sobre. a lealdade cívica dos católicos.
Alguns mártires ingleses morreram protestando a sua lealdade à rainha, e quando a Armada Invencível, apoiada por Pio V, que esperava que o domínio espanhol em Inglaterra ajudasse a impor as suas sanções, partiu em 1588, os católicos ingleses não estavam menos dispostos a aceitá-la do que o resto dos seus compatriotas. A Europa mudou muito; o tempo das lutas entre Gregório VII e Henrique IV, Alexandre III e Barbarossa, Inocêncio III e João da Inglaterra, o tempo do “Unam Sanctam” de Bonifácio VIII, havia passado para a história. Aproximava-se o momento em que outro Sumo Pontífice, Pio IX, iria declarar: “Hoje ninguém pensa no direito de depor os príncipes, que antigamente exercia a Santa Sé e muito menos o Sumo Pontífice”.
Pio V esqueceu o seu fracasso contra os ingleses, no ano seguinte, quando Don Juan da Áustria e Marcantonio Colonna, apoiados política e economicamente pela Santa Sé, acabaram com o poder dos turcos no Mediterrâneo. Comandando um exército de vinte mil soldados, partiram de Corfu e encontraram a frota turca no Golfo de Lepanto.
Lá eles derrotaram os turcos em uma das batalhas navais mais famosas. O Papa rezou pela frota cristã – muitas vezes com os braços cruzados – desde que ela partiu. Além disso, ele decretou orações públicas e jejuns privados. Precisamente no momento da batalha, acontecia na igreja de Minerva uma procissão do santo rosário para rezar pela vitória dos cristãos.
O Papa estava discutindo alguns assuntos com vários cardeais; de repente, ele interrompeu a conversa, abriu a janela e permaneceu alguns minutos com os olhos fixos no céu. Depois fechou a janela e disse aos cardeais: “Não é hora de falar de negócios; agradeçamos a Deus pela vitória que concedeu aos exércitos cristãos”. Para comemorar esta vitória, incluiu posteriormente, na Ladainha da Virgem, a invocação “Auxílio dos Cristãos” e instituiu uma festa em honra do santo rosário.
O dia da grande vitória foi 7 de outubro de 1571. No ano seguinte, o Papa sofreu um violento ataque de uma dolorosa doença de que sofria há muito tempo e que as suas austeridades agravaram. Esta doença o levou ao túmulo em 1º de maio de 1572, aos sessenta e oito anos.
São Pio V – o último dos Papas a alcançar a honra dos altares até ao advento de São Pio X – foi canonizado em 1712. O santo Pontífice praticou a austeridade monástica da sua juventude ao longo da sua vida. A sua bondade e fervor eram proverbiais: ele não se contentava em ajudar financeiramente os pobres e os doentes, mas assistia-os pessoalmente.
É verdade que no caráter de São Pio V havia também um aspecto de grosseria, que muitos historiadores sublinharam; mas durante o seu pontificado, no qual não lhe faltou o apoio e o exemplo de homens da estatura de São Filipe Néri, Roma começou a perceber os resultados do Concílio de Trento e mais uma vez mereceu o título de Cidade Apostólica e Primeira Sé do mundo.
Um parente de São Francisco Xavier, o doutor Martín de Azpilcueta, deixou um interessante testemunho do clima que reinava em Roma, numa carta que escreveu à sua família. O doutor Azpilcueta, que viajou muito, elogiou os habitantes de Roma, a sua boa conduta e o seu espírito religioso. Certamente os viajantes do tempo de Leão X e Paulo III não se exprimiram nos mesmos termos e a mudança deveu-se, sobretudo, a São Pio V.
(BUTLER Alban de, Vida de los Santos: vol. II, ano 1965, pp. 223-226)
[1] A nova liturgia era obrigatória em toda a Igreja Ocidental, exceto nos casos em que existiam costumes locais com mais de duzentos anos, como, por exemplo, na Ordem dos Pregadores, à qual pertencia o Papa.

