SETE DORES DE NOSSA SENHORA (15/09)

SETE DORES DE NOSSA SENHORA – 2ª classe
Duas festas de Nossa Senhora: a Natividade e as Sete Dores – Depois de dedicar a última memória à infância de Maria e encerrar esta alegre Oitava da Natividade, aqui a Igreja, sem transição, nos propõe meditar hoje sobre as dores que marcarão a sua vida como Mãe do Messias e de Co-Reparadora da raça humana. Nos dias da Oitava a ideia de sofrimento não nos vinha à mente, desde então considerávamos a graça, a beleza da menina que acabava de nascer; mas, se nos perguntarmos: “O que será dessa menina?” Teremos instantaneamente compreendido que, antes que todas as nações um dia a proclamassem bem-aventurada, Maria teve que sofrer com o seu Filho pela salvação do mundo.
O sofrimento de Maria – Através da voz da Liturgia, Ela mesma nos convida a considerar a sua dor: “Ó todos vós que passais pelo caminho, olhai, vejde e dizei-me se há dor semelhante à minha dor… Deus me colocou e como que me fixou na desolação.”[1] A dor da Santíssima Virgem é obra de Deus; ao predestiná-la para ser Mãe de seu Filho, Deus uniu-a indissoluvelmente à pessoa, à vida, aos mistérios, ao sofrimento de Jesus, para ser sua fiel colaboradora na obra da redenção.
Entre o Filho e a Mãe deveria haver uma comunicação perfeita de sofrimento. Quando uma mãe vê o filho sofrer, ela sofre com ele e sente rejeição por tudo que ele sofre; o que Jesus sofreu no seu corpo, Maria sofreu no seu coração, com os mesmos propósitos e com a mesma fé e o mesmo amor.
“O Pai e o Filho na eternidade compartilham a mesma glória”, disse Bossuet; a Mãe e o Filho, no tempo, participam das mesmas dores. O Pai e o Filho desfrutam da mesma fonte de felicidade; a Mãe e o Filho bebem da mesma torrente de amargura. O Pai e o Filho têm o mesmo trono; a Mãe e o Filho, a mesma cruz. Se o corpo de Jesus é destruído pelos golpes, Maria sente todas as feridas; se a cabeça de Jesus é trespassada por espinhos, Maria é dilacerada com todas as pontas; se lhe é oferecido fel e vinagre, Maria bebe todo o seu amargor; se o seu corpo for estendido numa cruz, Maria sofre toda a violência”.[2]
Condolência – Esta comunicação de sofrimento entre o Filho e a Mãe chama-se Condolência. A condolência é o eco fiel e a repercussão da Paixão. Condoer-se com alguém é sofrer com ele, é sentir em nosso coração, como se fosse nosso, suas mágoas, sua tristeza, sua dor. Desta forma, as Condolências foram para a Santíssima Virgem a participação perfeita nas dores e na Paixão do seu Filho e nas disposições que o animaram no seu sacrifício.
Por que Maria padece? – Parece que a Santíssima Virgem não deveria sofrer, pois foi concebida sem pecado e nunca conheceu o menor mal moral. O sofrimento deve ser um grande bem, porque Deus, que tanto ama o seu Filho, se lhe entregou como herança; e como, depois do Filho, Deus não ama mais nenhuma criatura do que a Santíssima Virgem, quis também dar-lhe a dor como o dom mais rico.
Além disso, era apropriado que, pela união que teve com o Filho, Nossa Senhora, como ele, passasse pela morte e pela dor. De alguma forma, isso foi necessário para que aprendêssemos uns com os outros como deveríamos aceitar a dor que Deus permite para o nosso bem maior. Maria ofereceu-se livre e voluntariamente e uniu o seu sacrifício e a sua obediência ao sacrifício e à obediência de Jesus, para carregar com Ele todo o peso da expiação que a justiça divina exigia.
Ela fez muito mais do que compadecer-se com todas as dores do seu Filho; ela realmente participou da paixão com todo o seu ser, com o coração e com a alma, com amor fervoroso e com simples tranquilidade; sofreu no seu coração tudo o que Jesus pode sofrer na sua carne, e há até teólogos que acreditaram que Nossa Senhora sentia no seu corpo as mesmas dores que o seu Filho sentia no seu; podemos acreditar, de fato, que Maria teve aquele privilégio com que alguns Santos foram distinguidos.
Seu martírio vem de Jesus – Mas para Maria o sofrimento não começou apenas no Calvário. Sua infância certamente transcorreu de forma tranquila e livre de preocupações. A dor vem com Jesus, “o Menino molesto, como diz Bossuet; porque onde quer que Jesus apareça, lá vai ele com a sua cruz e com ele vão os espinhos e faz com que todos os que ama compartilhem deles”.[3]
“A causa da dor de Maria, diz Monsenhor Gay, é Jesus. Tudo o que ela sofre vem de Jesus, a Jesus se refere e Jesus o motiva”.[4] A solenidade de hoje, que representa Maria principalmente no Calvário, recorda-nos nesta dor suprema as dores conhecidas ou desconhecidas que encheram a vida da Santíssima Virgem.
Se a Igreja decidiu pelo número sete, é porque este número expressa sempre a ideia de totalidade e universalidade, pois nos Responsórios das Matinas nos lembra de maneira especial as sete dores que o causaram na profecia do antigo Simeão, a fuga para o Egipto, a perdição de Jesus em Jerusalém, vê-lo carregando a cruz, a crucificação, a descida e sepultura do seu divino Filho: dores que verdadeiramente a tornaram Rainha dos mártires.
Rainha dos Mártires – Com este belo título, de fato, a Igreja saúda-a na Ladainha: “Que sofreu verdadeiramente, diz São Pascásio Radberto, Simeão assegura-nos quando diz: Uma espada traspassará a tua alma. Daí se infere com evidência que ela supera todos os mártires. Os outros mártires sofreram por Cristo na sua carne; porém, eles não poderiam sofrer na alma, porque ela é imortal. Mas, como sofreu nesta parte de si mesma que é impassível, porque a sua carne, se assim podemos dizer, sofreu espiritualmente pela espada da Paixão de Cristo, a Santíssima Mãe de Deus foi mais que uma mártir. Porque amou mais do que ninguém, por isso sofreu mais do que ninguém também, a tal ponto que a violência da dor perfurou e dominou a sua alma em prova do seu amor inefável, porque sofreu na sua alma, por isso ele foi mais que um mártir, pois o seu amor, mais forte que a morte, tornou sua a morte de Cristo”.[5]
Seu amor, causa de sua dor – E de fato, para compreender a extensão e a intensidade da dor da Santíssima Virgem, seria necessário compreender qual era o seu amor por Jesus. Este amor é muito diferente do amor de outros santos e mártires.
Quando sofrem por Cristo, o seu amor suaviza os seus tormentos e às vezes até os faz esquecê-los. Nada disto aconteceu em Maria: o seu amor aumenta o seu sofrimento: “A natureza e a graça, diz Bossuet, unem-se para criar um sentimento mais profundo no coração de Maria. Nada existe tão forte ou tão impetuoso quanto o amor que a natureza dá a um filho e a graça dá a um Deus. Estes dois amores são dois abismos cujo fundo não se pode penetrar, nem se pode compreender toda a sua extensão…”[6]
A dor e a alegria de Maria – Mas se o amor é causa de dor em Maria, é também causa de alegria. Maria sofreu sempre com uma tranquilidade inalterável e com grande força de alma. Ela sabia melhor do que São Paulo que nada, nem mesmo a morte, seria capaz de separá-la do amor do seu Filho e do seu Deus. São Pio X escrevia “que na hora suprema, se viu a Virgem de pé, junto à Cruz, embargada, sem dúvida, pelo horror do espetáculo, mas feliz e contente de ver seu Filho imolar-se pela salvação do gênero humano”[7]. E superando São Paulo, ela nada num mar de alegria em meio à sua dor imensurável.
Em Nossa Senhora, como em Jesus Cristo, salvas todas as circunstâncias, a alegria mais profunda anda junto com a dor mais profunda que uma criatura pode suportar cá na terra. Ela ama a Deus e à vontade divina mais do que qualquer pessoa neste mundo, e sabe que no Calvário a vontade divina se cumpre; sabe que a morte do seu Filho dá à justiça de Deus o preço que ela exige para a redenção dos homens, que a partir daquele momento lhe são confiados como seus filhos e aos quais ela amará e já ama como amou Jesus.
Agradecimento a Maria – “Assim como o mundo inteiro está em dívida com Deus, Nosso Senhor, disse Santo Alberto Magno, o mesmo acontece com Nossa Senhora pela parte que ela teve na Redenção”[8]. Hoje é melhor notarmos, ó Maria, o que fizestes por nós e o que vos devemos. Queixastes-vos que “olhando para os homens e procurando alguém que se lembrasse da vossa dor e tivesse compaixão de vós, encontrastes pouquíssimos”.[9] Não aumentaremos o número dos vossos filhos ingratos; por isso, unimo-nos à Igreja para recordar os vossos sofrimentos e dizer-vos o quão grande é a nossa gratidão.
Sabemos, ó Rainha dos mártires, que uma espada de dor trespassou a vossa alma, e que só o espírito de vida e de toda consolação poderia sustentar-vos e dar-vos coragem quando o vosso Filho morresse.
E, sobretudo, sabemos que, se foste ao Calvário, se toda a vossa vida, como a de Jesus, foi um martírio prolongado, é porque tivestes que desempenhar perto do nosso Redentor e em união com ele o papel que a nossa primeira mãe Eva desempenhou junto de Adão e junto com ele em nossa queda.
Verdadeiramente nos resgatastes com Jesus; com ele e na dependência dele, nos ganhastes de côngruo, por certa conveniência, a graça que ele nos mereceu de condigno, em justiça, em razão da sua infinita dignidade. Por isso, saudamos-vos com amor e gratidão como “Nossa Rainha, Mãe de misericórdia, vida e doçura e nossa esperança”.
E, porque sabemos que a nossa salvação está em vossas mãos, consagramos-vos toda a nossa vida, para que com a vossa direção materna e a vossa poderosa proteção possamos ir ao vosso encontro na glória do Paraíso, onde, com o vosso Filho, viveis coroada e feliz para sempre. Assim seja.
(GUERANGER, Dom Prospero. El Año Litúrgico: tomo V, ano 1954, pp. 410-417)
[1] Lamentações I, 12-13.
[2] Sermão para a Compaixão, Oeuvres orat., II, p. 472.
[3] Panegírico de São José, t. II, 137.
[4] 41ª Conferência aux mereschretiennes, t. II, 199.
[5] Carta sobre a Assunção, n. 14, P. L., 30, 138.
[6] Sermão sobre a Assunção, t. III, 493.
[7] Encíclica Ad diem illum, 2 de fevereiro de 1904.
[8] Questão super missus, 150.
[9] Santa Brígida, Revelações, 1, II, c. 24.

