SÁBADO SANTO

SÁBADO SANTO
Ano Litúrgico – Dom Prospero Gueranger
PELA MANHÃ
Jesus no túmulo – A noite passou sobre o túmulo onde repousa o corpo do Homem-Deus. Mas se a morte triunfa nas profundezas desta gruta silenciosa; se tem entre seus laços Aquele que dá vida a todos os seres, seu triunfo será muito curto; os soldados vigiam em vão na entrada do túmulo; não serão capazes de manter o divino cativo quando ele voltar. Os santos Anjos adoram com profundo respeito o corpo inanimado daquele cujo sangue “purificará o céu e a terra”[1]. Este corpo, separado da alma por um breve momento, permaneceu unido ao Verbo; a alma que momentaneamente deixou de animá-lo não perdeu sua união com a Pessoa do Filho de Deus. A divindade permanece unida também ao sangue derramado no Calvário, que deve reentrar nas veias do Homem-Deus no momento de sua próxima ressurreição.
O excesso do amor divino – Aproximemo-nos daquele túmulo e veneremos os restos mortais do Filho de Deus. Agora conheceremos os efeitos do pecado. “Por meio do pecado, a morte entrou no mundo e passou a todas as pessoas.”
Jesus Cristo, “que não conheceu pecado”[2], permitiu, contudo, que a morte estendesse o seu domínio sobre Ele, para diminuir em nós a repugnância que lhe professamos e para nos restituir, uma vez ressuscitados, a imortalidade que o pecado nos havia roubado. Na sua Encarnação, ele dignou-se a tomar “a forma de um escravo”[3]; neste mistério ele se humilhou ainda mais. Veja-o morto em um túmulo! Se este espetáculo nos revela o poder vergonhoso da morte, mostra-nos ainda mais o imenso e incompreensível amor que Deus tem pelo homem. Este amor não recuou diante de nenhum excesso; e por isso podemos dizer que, se o Filho de Deus se rebaixou além de toda medida, fomos ainda mais glorificados por suas humilhações. Que isto nos leve a amar aquele túmulo em que devemos nascer para a vida; e depois de lhe termos agradecido por ter querido morrer por nós na cruz, agradeçamos-lhe também por ter aceitado por nós a humilhação do sepulcro.
Nossa Senhora das Dores – Vamos agora a Jerusalém e visitemos a Mãe das Dores. A noite também passou por seu coração, e as cenas do dia não cessaram de assaltar sua memória. Seu Filho foi pisoteado pelos homens, enquanto ela observava seu sangue escorrer. Quantas lágrimas ela derramou durante essas longas horas; e ainda assim Jesus não lhe foi devolvido! Ao lado dela, Madalena, completamente destruída pelos solavancos e empurrões que recebeu nas ruas de Jerusalém e no Calvário, está sem palavras de dor. Ela espera o amanhecer do dia seguinte para poder retornar ao túmulo e contemplar os restos mortais de seu amado Mestre mais uma vez. As outras mulheres, menos amadas que Madalena, mas ainda assim estimadas por Jesus, que desafiaram a zombaria dos judeus e dos soldados para ajudar Jesus até sua morte, agora cercam cuidadosamente a Virgem e pensam em aliviar sua própria dor indo com Madalena, uma vez terminado o sábado, depositar no túmulo o tributo de seu amor.
Os discípulos – João, o filho adotivo, o amado de Jesus, chora pelo Filho e pela Mãe. Os outros apóstolos, os discípulos José de Arimateia e Nicodemos, visitam um por um esta mansão de dor. Pedro, com a humildade do seu arrependimento, não tem medo de se apresentar na presença da Mãe da misericórdia. A tortura de Jesus é discutida em voz baixa, por um lado, e a ingratidão de Jerusalém, por outro. A Santa Igreja, no ofício desta noite, sugere-nos algumas ideias de como devem ter sido as conversas destes homens que foram tão atrozmente comovidos por uma catástrofe tão terrível. “Assim morre o justo, dizem eles, e ninguém se comove; foi arrebatado do meio da iniquidade; como um cordeiro, não abriu a boca; morreu cercado de angústia, mas sua memória é preservada em paz.”[4]
A espera pela Ressurreição – Assim esses homens fiéis conversam, enquanto as santas mulheres, vítimas de sua dor, pensam nos cuidados do funeral. A santidade, a bondade, o poder, o sofrimento e a morte de Jesus estão presentes em seus pensamentos; mas elas não se lembram da Ressurreição que Ele anunciou e que, sem dúvida, acontecerá em breve. Somente Maria vive com essa espera certa. O Espírito Santo, falando da mulher forte, diz: “Durante a noite a sua lâmpada não se apaga”[5]; este pensamento se cumpre hoje de modo especial na Mãe de Jesus. Seu coração não sucumbe, porque ela sabe que a sepultura deve devolver vivo o seu Filho. A fé na Ressurreição do Salvador, esta fé sem a qual, como diz o Apóstolo: “A nossa religião seria vã”[6], está, por assim dizer, concentrada na adoração de Maria. A Mãe da Sabedoria preserva este precioso repositório; e assim como ela carregou em seu ventre Aquele que o céu e a terra não podem conter, assim também neste dia, por causa de sua firme crença nas palavras de seu Filho, toda a Igreja está concentrada nela. Que dia sublime é o Sábado Santo, que, no meio de toda a sua tristeza, vem exaltar ainda mais a Mãe de Deus! A Santa Igreja sempre guardará sua memória; e por isso, querendo consagrar um dia especial a cada semana à sua Rainha, A Igreja lhe dedicou o sábado.
Chegou a hora de ir para a casa de Deus. Os sinos ainda não são ouvidos; mas os mistérios da Liturgia que serão desenvolvidos esta manhã não deixam de suscitar nos fiéis as mais ternas emoções. Conservemos a memória do que acabamos de sofrer no túmulo, bem como aos pés da Mãe das Dores, e preparemos as nossas almas para as alegrias que a fé nos preparará.
O OFÍCIO DESTE DIA
Ritos do Ofício – Desde os tempos antigos, tanto o dia de hoje como a Sexta-feira Santa passaram sem a oferta do Sacrifício divino. Ontem a Igreja não celebrou porque o aniversário da morte de Cristo parecia lançar uma sombra escura sobre todo o dia. A mesma razão a leva a se abster de celebrar o Sacrifício hoje também. O sepultamento de Cristo é a continuação da sua Paixão; e enquanto seu corpo repousa inanimado no túmulo, não é apropriado renovar o mistério divino no qual ele aparece glorioso e ressuscitado. A mesma Igreja Grega que, durante a Quaresma, se orgulha de não jejuar no sábado, imita a Igreja Latina reservando disciplinas mais austeras para este dia. Este dia é, de fato, um dia de profundo luto, durante o qual a Igreja se detém junto ao túmulo do Senhor, meditando sobre sua Paixão e Morte, até o momento em que, tendo celebrado a solene Vigília, expectativa noturna da Ressurreição, receberá a alegria pascal cuja plenitude transbordará durante os dias seguintes.
Mas a Esposa de Cristo não pode deixar de permanecer sentada hoje ao lado do túmulo onde seu Senhor repousa e só quebrará o silêncio cantando ou recitando as várias Horas do Ofício, como nos dois dias anteriores. Antes do nascer do sol ela começa com o canto das Trevas; Prima, Tercia, Sexta e Nona se seguirão para recordar-lhe o que Jesus sofreu no dia anterior, precisamente nestas horas.
Ele não sofre mais, descansa e a Igreja sabe disso; descansa como um vencedor cujo triunfo está próximo. É por isso que no Ofício, depois de ter cantado: “Cristo Se fez obediente até à morte, e morte de cruz”, acrescenta imediatamente: “e assim Deus o exaltou e lhe deu um nome que está acima de todo o nome”. E conclui com a oração: “Nós vos suplicamos, ó Deus todo-poderoso, que nós, que nos preparamos com devota expectativa para a ressurreição do vosso Filho, alcancemos a glória da sua ressurreição. Pelo mesmo Nosso Senhor.”
As Vésperas concluem este dia, pois a Igreja suprime as Completas. Não nos impõe a celebração deste Ofício, que normalmente precede o repouso, pois nos convida a todos a permanecermos vigilantes nesta noite, até o momento abençoado em que a Ressurreição do Senhor será proclamada com alegria.
PARA A TARDE
Será útil meditarmos por alguns momentos sobre o mistério dos três dias durante os quais a alma do Redentor permaneceu separada do seu corpo. Esta manhã visitamos o túmulo e adoramos o corpo sagrado, ao qual Madalena e suas companheiras se preparam para prestar novas homenagens amanhã bem cedo. Neste momento é oportuno oferecer nossas homenagens à santa alma de Jesus. Ela não está no túmulo; procuremo-la nos lugares onde ela vive, esperando que venha reavivar os membros dos quais a morte a separou por um tempo.
Inferno – Existem quatro vastas regiões nas quais nenhum ser vivo jamais entrará; a revelação divina apenas nos ensinou sobre sua existência. O primeiro é o inferno dos condenados, um lugar terrível onde Satanás e seus anjos estão destinados, juntamente com os réprobos da raça humana, às chamas vingativas da eternidade. É a corte do príncipe das trevas, onde ele constantemente forma planos malignos e continuamente frustrados contra Deus e sua obra.
O limbo das crianças[7] – O segundo é o Limbo, onde ficam detidas as almas das crianças que deixaram este mundo antes de serem batizadas. Segundo a doutrina mais autorizada da Igreja, os hóspedes desta mansão não sofrem nenhum dano e, embora não sejam chamados a ver a Essência divina, são capazes de uma felicidade natural proporcional aos seus desejos.
Purgatório – A terceira região é o lugar da expiação, onde as almas que partiram deste mundo com o dom da graça terminam de purificar suas manchas para serem admitidas e recompensadas eternamente.
O limbo dos Justos – Finalmente, o limbo em cujas sombras está detida toda a multidão de santos que morreram, desde o justo Abel até o momento em que Cristo expirou na cruz. Estão aqui os nossos primeiros pais, Noé, Abraão, Moisés, Davi, os antigos profetas; Jó e os outros justos dos gentios; as figuras sagradas cuja vida é próxima à de Cristo, Joaquim, pai de Maria, e Ana, sua mãe; José, esposo da Virgem e pai adotivo de Jesus; João, seu precursor com seus pais Zacarias e Isabel.
Até que o portão do céu seja aberto pelo sangue redentor, nenhum justo pode ascender a Deus. Ao deixar este mundo, as almas mais santas têm que descer ao limbo. Mil passagens no Antigo Testamento apontam para os “infernos” como a morada dos justos que foram fiéis e honraram a Deus; somente no Novo se fala do Reino dos Céus. Essa permanência temporária não acarreta nenhuma punição além de detenção e cativeiro. As almas que ali habitam estão em graça, seguras, com felicidade eterna; elas suportam com resignação este exílio, fruto do pecado, mas veem com alegria sempre crescente aproximar-se o momento da sua libertação.
Jesus nos Infernos – O Filho de Deus, tendo aceitado todas as condições da humanidade, só triunfaria pela sua Ressurreição e só abriria as portas do céu pela sua Ascensão; sua alma, separada do corpo, teve que descer aos “Infernos” e compartilhar um momento na mansão dos justos exilados. “O Filho do Homem”, tinha dito, “estará três dias no coração da terra”[8]. Mas, embora sua entrada nesses lugares fosse recebida com aclamações do povo santo, ele deveria demonstrar sua majestade e mostrar o poder e a glória de Emanuel. Assim que Jesus deu seu último suspiro na cruz, o limbo dos justos foi subitamente iluminado pelo esplendor celestial. A alma do Redentor, unida à divindade do Verbo, desceu num instante a essas sombras e de um lugar de exílio fez um paraíso. Esta é a promessa que Jesus fez ao ladrão arrependido após sua morte: “Hoje estarás comigo no paraíso”.
A felicidade dos Justos – Quem pode descrever a felicidade dos justos neste momento tão desejado? Quem, sua admiração e amor ao contemplar esta alma divina que vem ao mesmo tempo compartilhar e levantar seu exílio? Que olhar bondoso a alma de Jesus lança sobre este imenso exército de eleitos, que ele reuniu ao longo de tantos séculos sobre esta parte da sua Igreja, que adquiriu com o seu sangue, e à qual os méritos deste sangue foram aplicados pela misericórdia do Pai antes de ser derramado! Nós, que temos a esperança de ascender, quando deixarmos este mundo, àquele que foi preparar um lugar para nós no céu,[9] juntemo-nos às alegrias de nossos pais e adoremos o amor do Emanuel, que se dignou a permanecer três dias nestas moradas subterrâneas, para não deixar nada nos destinos da humanidade, mesmo temporários, que Ele não tenha aceitado e santificado.
Jesus, vencedor de Satanás – Mas nesta visita aos Infernos o Filho de Deus também vem manifestar seu poder. Sem descer substancialmente às masmorras de Satanás, Ele fez sentir sua presença; é necessário que o orgulhoso príncipe deste mundo dobre os joelhos e se humilhe. Neste Jesus, a quem ele havia crucificado por meio dos judeus, agora reconhece o próprio Filho de Deus. O homem é liberto, a morte é destruída, o pecado é apagado, as almas dos justos não mais descerão ao seio de Abraão; elas ascenderão ao céu com os Anjos para reinar com Cristo, seu Chefe divino. O reino da idolatria vai sucumbir; os altares sobre os quais Satanás recebia o incenso da terra foram destruídos. A casa do homem forte e armado foi forçada por seu adversário divino; seus despojos foram arrebatados[10], a carta da nossa condenação foi arrancada da serpente; e a Cruz que ele vira erguida com tanta alegria para o Justo, foi para ele, segundo a expressão enérgica de Santo Antônio, como um anzol mortal apresentado como isca ao monstro marinho que morre, desfazendo-se em pedaços depois de tê-lo engolido.
A alma de Jesus também faz sentir sua presença entre os Justos que suspiram no fogo da expiação. Sua misericórdia alivia seus sofrimentos e encurta o tempo de sua provação. Muitos deles veem seus sofrimentos terminarem nestes três dias e se juntam à multidão de santos para cercar com seus votos e seu amor Aquele que abre as portas do céu. Não é contrário à fé cristã pensar, com alguns teólogos, que a permanência do Homem-Deus na região vizinha do limbo das crianças também lhes trouxe consolação; elas então sabiam que um dia tomariam seus corpos novamente e veriam abrir-se uma morada menos sombria e mais alegre do que aquela em que a justiça divina os mantinha cativos até o dia do grande julgamento.
Oração – Ó alma do Redentor! Nós vos saudamos e vos adoramos durante essas horas em que vos dignastes passar com nossos pais. Glorificamos a vossa bondade, admiramos a vossa ternura para com os vossos escolhidos. Agradecemos por ter humilhado nosso temível inimigo; dignai-vos sempre a deitá-lo aos nossos pés, mas: Oh Emanuel! Vós estais na sepultura há muito tempo e é hora de unir vossa alma ao vosso corpo; o céu e a terra aguardam a vossa Ressurreição, e a vossa Igreja já está impaciente por rever o seu Esposo. Saí da sepultura, ó autor da vida, triunfai sobre a morte e reinai para sempre!
A VIGÍLIA PÁSCOA
Desde os primeiros séculos, os fiéis mantinham vigília na igreja durante toda a noite, de sábado para domingo, em memória e homenagem ao momento em que Cristo, triunfante sobre a morte, saiu do túmulo. Mas entre todas as vigílias sagradas do ano, nenhuma era frequentada com tanta assistência e entusiasmo como esta: os fiéis que celebravam a passagem de Cristo da morte para a vida gloriosa, participavam ao mesmo tempo, como testemunhas, da solene administração do batismo aos catecúmenos: uma função na qual se manifestava a passagem da morte espiritual para a vida da graça.
A Igreja Oriental preservou a antiga tradição desta grande Vigília até hoje. No Ocidente, desde a Alta Idade Média, o desejo de aliviar a austeridade do jejum que durava da noite da Sexta-feira Santa até a Vigília Pascal, contribuiu para que o horário da Missa noturna da Ressurreição fosse gradualmente antecipado, primeiro para depois do meio-dia, depois para o meio-dia até ao século XII e, finalmente, até a manhã do Sábado Santo. Por fim, Durando de Mende, que compôs sua Justificação dos Ofícios Divinos no final do século XIII, atesta que em sua época apenas algumas igrejas ainda preservavam o costume primitivo.
Esta modificação introduziu uma espécie de contradição entre o mistério deste dia e o Ofício Divino celebrado nele. Cristo ainda estava no túmulo, e sua Ressurreição já estava sendo celebrada. Por isso, os veneráveis ritos desta Vigília, tão apropriados para permitir que a alma participe dos mistérios da Páscoa, perderam muito do seu significado.
Além disso, em nossos dias, essa cerimônia matinal acontecia durante o horário de trabalho, o que dificultava a presença da maioria dos cristãos. Atendendo aos pedidos urgentes dos párocos e fiéis, o Papa Pio XII decretou em 1951 a restituição da Vigília à sua hora normal e a restauração dos seus ritos, convidando o povo cristão a retornar desta forma às tradições da antiga piedade dos nossos pais. Vamos, então, primeiro esboçar o plano da augusta função que será realizada; então explicaremos todas as suas partes.
A administração do batismo aos catecúmenos é o grande objetivo desta longa cerimônia; é o ponto central para onde tudo é direcionado. Os fiéis devem, portanto, ter isso constantemente em mente se desejam acompanhar esse drama sagrado e imponente com inteligência e proveito. Primeiro, o novo fogo é abençoado; em seguida vem a inauguração do círio pascal. A isso seguem lições proféticas que formam um todo com o que precede e o que segue. Uma vez finalizados, a água é abençoada. Uma vez preparada a matéria do batismo, os catecúmenos recebem o sacramento da regeneração. Imediatamente o Bispo[11] conferia-lhes a Confirmação. Então, os fiéis que testemunharam o novo nascimento dos neófitos também são convidados a renovar as promessas feitas em seu próprio batismo. Por fim, tem início o Santo Sacrifício em honra da Ressurreição do Senhor e os neófitos são admitidos pela primeira vez para participar dos sagrados mistérios.
A estação – Em Roma, a Estação é celebrada em São João de Latrão, a igreja matriz; o sacramento da regeneração é administrado no Batistério de Constantino. As grandes memórias do século IV ainda flutuam sobre esses antigos santuários; todos os anos, ali se celebra o Batismo de adultos, e numerosas ordenações vêm se unir ao esplendor deste dia.
I – A bênção do novo fogo
O último escrutínio – Na quarta-feira passada, todos os catecúmenos foram convocados para este dia na hora Tercia (nove da manhã). A votação final está prestes a ocorrer. Os sacerdotes presidem; e o símbolo é pedido àqueles que ainda não o aprenderam. Após repetir a Oração do Senhor e os atributos bíblicos dos quatro Evangelistas, um dos sacerdotes despede os candidatos ao Batismo, após ter recomendado que permanecessem em recolhimento e oração.
O fogo novo – Por volta da hora Nona (três da tarde), o bispo vai com todo o seu clero à igreja. Neste momento começa a Vigília do Sábado Santo. O primeiro rito que deve ser cumprido é a bênção do fogo novo, cuja luz deve iluminar a cerimônia durante toda a noite. Nos primeiros séculos, havia o costume de pegar fogo em uma pederneira todos os dias para acender as lâmpadas e velas durante este ofício; e esta luz permanecia acesa na igreja até as Vésperas do dia seguinte. A Igreja de Roma praticava esse costume com muito mais solenidade na manhã da Quinta-feira Santa; e neste dia o novo fogo recebia uma bênção especial. Segundo informações encontradas em uma carta que o Papa Zacarias endereçou ao Arcebispo de Mainz, São Bonifácio (século VIII), deduz-se que com esse fogo eles acendiam três lâmpadas que eram então guardadas em um lugar secreto, cuidando delas com muito cuidado durante esse tempo. Dessas lâmpadas era tirada a luz para a noite do Sábado Santo. Mais tarde, durante o pontificado do Papa São Leão IV, em 847, a Igreja de Roma acabou estendendo ao Sábado Santo o costume de fazer fogo com duas pederneiras, como nos outros dias do ano.[12]
Cristo: pedra e luz – O significado deste uso simbólico, que na Igreja Latina é praticado somente neste dia, é fácil de entender. Cristo disse: “Eu sou a luz do mundo”[13]; a luz material é, portanto, a figura do Filho de Deus; a pedra também é uma das figuras sob as quais o Salvador do mundo aparece nas Sagradas Escrituras. “Cristo é a pedra angular”, dizem-nos em comum acordo São Pedro[14] e São Paulo[15], que apenas lhe aplicam as palavras da profecia de Isaías[16]. Mas neste ato, a centelha viva que sai da pedra representa um símbolo ainda mais completo. Simboliza Jesus Cristo se jogando para fora do túmulo escavado na rocha, através da pedra que fecha sua entrada.
O túmulo de Cristo está localizado fora dos portões de Jerusalém; as piedosas mulheres e os Apóstolos devem deixar a cidade para alcançá-lo e testemunhar a Ressurreição. Por esta razão, o Bispo[17] e sua procissão acabam de sair da igreja para ir ao átrio onde o braseiro do fogo novo arde durante a noite. O Pontífice o abençoa com a seguinte oração:
O Senhor esteja convosco.
E com o teu espírito.
Oremos.
Ó DEUS, que por vosso Filho, Pedra angular da Igreja, acendestes nos corações de vossos fiéis o fogo de vossa claridade, santi✠ficai este fogo novo, que da pedra tiramos para nosso uso, e concedei-nos que, durante estas festas pascais, sejamos de tal sorte inflamados de celestiais desejos que mereçamos com a alma pura chegar às festas da claridade perpétua. Pelo mesmo Cristo, Nosso Senhor.
Então ele asperge o fogo com água benta e, colocando incenso nas brasas retiradas do braseiro, incensa o fogo.
É, portanto, justo que este fogo misterioso, destinado a iluminar o círio pascal e, mais tarde, o próprio altar, receba uma bênção especial e seja acolhido pelo povo cristão com sinais de alegria.
II – A bênção do Círio pascal
A vela que a Santa Igreja preparou para brilhar intensamente durante a longa Vigília que agora se inicia é então apresentada ao Bispo; uma vela mais pesada e grossa do que todas as outras usadas em outras festas. Esta vela é única; tem o formato de uma coluna e foi criada para representar Cristo. Antes de ser acesa, sua figura é representada na coluna de nuvem que cobriu a marcha dos hebreus na saída do Egito; nesta primeira forma é uma figura de Cristo no túmulo, inanimado, sem vida. Depois de acesa, veremos nela a coluna de fogo que ilumina os passos do seu povo escolhido; e também a figura de Cristo, toda resplandecente com o esplendor da sua Ressurreição.
O Bispo então desenha uma cruz com um estilete entre os furos externos destinados a receber os grãos de incenso. No topo desta cruz
ele imediatamente traça a letra grega Alfa, e na parte inferior a letra Ômega, e nos ângulos da cruz traça quatro números que são o milênio do ano atual. Ao mesmo tempo diz as seguintes palavras:
(1) Cristo ontem e hoje.
(2) Princípio e fim.
(3) Alpha
(4) e Omega
(5) Dele são os tempos
(6) e os séculos.
(7) A Ele a glória e o império
(8) por todos os séculos dos séculos. Amém.
Depois de gravados estes sinais, o Bispo toma cinco grãos de incenso, asperge-os e incensa-os três vezes, e depois coloca-os nos buracos da cruz: um no alto, um no centro, um nos pés e um em cada braço, dizendo:
(1) Por vossas santas chagas
(2) gloriosas
(3) nos guarde
(4) e nos conserve
(5) O Cristo Senhor. Amém.
O número desses grãos de incenso, assim inseridos na massa do Círio, representa as cinco chagas de Cristo na cruz, ao mesmo tempo que seu uso significa os perfumes que Madalena e suas companheiras prepararam enquanto Cristo repousava no túmulo.
Em seguida, o diácono acende uma pequena vela ou pavio no fogo novo, oferece-o ao Bispo e este acende o círio pascal dizendo:
Que a luz de Cristo que ressuscita gloriosamente dissipe as trevas do coração e da mente.
Então abençoa o Círio recitando a seguinte oração:
O Senhor esteja convosco.
E com o teu espírito.
Oremos.
NÓS Vos suplicamos, ó Deus onipotente, venha sobre este incenso a copiosa efusão de vossas bên✠çãos. Acendei Vós mesmo, que sois o Regenerador invisível, este esplendor noturno, a fim de que, não somente o sacrifício que Vos é oferecido nesta noite cintile no fulgor de vossa misteriosa Luz, como também em todo lugar em que for levada alguma parcela do Mistério desta santificação, cedam ao poder de vossa Majestade todos os artifícios da malícia do demônio. Por Cristo, nosso Senhor.
Durante esse tempo todas as lâmpadas da igreja são apagadas; antigamente, os fiéis, antes de irem à igreja, apagavam o fogo de suas casas; e não era reacendido em toda a cidade, exceto pela comunicação do fogo que era abençoado e que mais tarde era dado aos fiéis como um presente da Ressurreição divina. Não podemos esquecer de destacar aqui um novo símbolo que é mais expressivo que os demais. A extinção de toda a luz neste momento representa a revogação da antiga lei, que terminou quando o véu do templo foi rasgado; e o aparecimento do fogo novo representa a publicação misericordiosa da nova lei que Jesus Cristo, Luz do mundo, vem trazer, dissipando todas as sombras da primeira aliança.
III. A procissão solene e a proclamação da Páscoa
O diácono agora veste a estola branca e a dalmática, pega Círio pascal abençoado e entra na igreja escura à frente da procissão. Depois de dar alguns passos, a procissão para, todos se voltam para o Círio que o diácono levanta bem alto, dizendo:
“Luz de Cristo.”
Todos lhe respondem a uma só voz:
“Graças a Deus.”
Este primeiro espetáculo de luz proclama a divindade do Pai revelada a nós por Jesus Cristo: “Ninguém conhece o Pai”, ele nos diz, “exceto o Filho e aquele a quem o Filho quis revelá-lo”.
Todos se levantam e o bispo que abençoou Círio pascal acende a sua própria vela, então a procissão continua pela igreja.
No meio da igreja a procissão para novamente e todos se ajoelham novamente enquanto o diácono canta em um tom mais alto do que da primeira vez:
“Luz de Cristo.”
E todos respondem:
“Graças a Deus.”
Esta segunda manifestação anuncia a divindade do Filho que apareceu aos homens na Encarnação e lhes mostrou sua igualdade de natureza com o Pai. O clero e os demais ministros do altar acendem suas velas no Círio pascal, e a procissão avança até que o diácono chegue perto do altar.
Pela terceira vez ele levanta o Círio e, enquanto todos se ajoelham, ele canta novamente:
“Luz de Cristo”
E a resposta é a mesma:
“Graças a Deus.”
Todos então se levantam e recebem a luz do Círio pascal. Esta terceira manifestação de luz proclama a divindade do Espírito Santo, que nos foi revelada por Jesus Cristo quando deu aos apóstolos o mandato solene que a Igreja deve cumprir nesta noite: “Fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”. Por meio do Filho, que é “a luz do mundo”, os homens conheceram a Santíssima Trindade, cuja confissão o Papa pedirá aos catecúmenos que façam antes de batizá-los, enquanto a vela de três braços recordará esse mistério aos presentes durante toda a noite.
Tal é o primeiro uso do novo fogo: anunciar os esplendores da Santíssima Trindade. Agora servirá para glorificar o Verbo Encarnado, completando o símbolo magnífico que deve atrair nossa atenção.
O Pontífice subiu ao trono e o diácono entrega-lhe o báculo. Depois se ajoelha diante do Pontífice, pedindo sua bênção para a cerimônia solene. O Pontífice dirige-se a eles com estas palavras:
ESTEJA o Senhor em vosso coração e em vossos lábios, para que digna e devotamente anuncieis os louvores de sua Páscoa.
O Círio pascal é colocado num castiçal no meio do santuário, o diácono incensa o livro colocado no púlpito, dá volta ao círio, incensando-o por todos os lados, retorna ao púlpito e, com todos segurando as velas acesas nas mãos, entoa o “Exsultet”.
O anúncio da Páscoa ressoa em meio aos louvores que o diácono profere sobre esta vela gloriosa; e celebrando a tocha divina, da qual ele mesmo é emblema, cumpre seu papel de arauto da Ressurreição do Homem-Deus. Somente ele, vestido de branco, enquanto o próprio Pontífice ainda veste as cores da Quaresma, faz sua voz ser ouvida na bênção do Círio com uma liberdade que normalmente não é concedida ao diácono diante do sacerdote, e menos ainda diante do bispo. Os intérpretes da Liturgia nos ensinam que o diácono aqui representa Madalena e as outras santas mulheres, que tiveram a honra de ser as primeiras a serem iniciadas pelo próprio Cristo no mistério de sua Ressurreição e foram encarregadas por ele de anunciar aos Apóstolos que já havia saído do túmulo e os precederia na Galileia.[18]
Mas agora é hora de ouvir os acentos melodiosos deste canto sagrado, que toca nossos corações e ao mesmo tempo nos dá uma prévia das alegrias que esta noite maravilhosa nos reserva. O diácono começa com este exórdio lírico:
EXULTE já de alegria a multidão dos Anjos no céu; celebrem-se com júbilo os divinos Mistérios[19], e o clamor da trombeta sagrada anuncie a vitória de tão grande Rei.
Alegre-se a terra banhada pelos raios tão brilhantes e pelos esplendores que o Rei eterno sobre ela derrama; alegre-se também e sinta que do mundo inteiro foram dissipadas as trevas.
Alegre-se igualmente a Igreja, nossa Mãe, adornada de tantos fulgores, e ressoem neste templo as vozes jubilosas do povo fiel.
Por isso, irmãos caríssimos, que aqui vos reunis à claridade desta luz tão santa, eu vos rogo que invoqueis comigo a misericórdia do Deus onipotente, para que eu, ainda, que sem mérito algum, por Ele admitido no número dos Levitas, receba um raio de sua luz, e possa, por sua graça, cantar dignamente os louvores deste Círio.
Por Nosso Senhor Jesus Cristo, seu Filho, que sendo Deus, com Ele vive e reina em união com o Espírito Santo,
Por todos os séculos dos séculos.
Amém.
O Senhor seja convosco.
E com o vosso espírito.
Elevai os corações.
Assim os temos para o Senhor.
Demos graças ao Senhor, nosso Deus.
É digno e justo.
VERDADEIRAMENTE é digno e justo louvar com todo o afeto do coração e do espírito, por nossa voz, o Deus invisível, o Pai onipotente e seu Filho Unigênito, Nosso Senhor Jesus Cristo, que pagou por nós ao Pai eterno a dívida de Adão e extinguiu com o seu Sangue precioso a obrigação da antiga culpa. Porque estas são as festividades da Páscoa em que é imolado o verdadeiro Cordeiro, cujo Sangue consagra as portas dos fiéis.
Esta é a noite, em que tirastes outrora do Egito os nossos pais, os filhos de Israel, e os fizestes passar o Mar Vermelho a pé enxuto. Sim, esta é a noite que dissipou as trevas do pecado com o fulgor de uma coluna de fogo. Esta é a noite que, em todo o mundo, arrebata aos vícios do século e às trevas do pecado, os que em Cristo creem, restituindo-os à graça e à sociedade dos Santos.
Esta é a noite em que o Cristo, quebrando os grilhões da morte, saiu vitorioso do sepulcro. Pois de nada nos aproveitaria haver nascido, se não houvéramos sido resgatados. Ó admirável efusão de vossa bondade para conosco! Ó inestimável excesso de vosso Amor! Para remir o escravo, entregastes o vosso Filho.
Ó pecado de Adão, certamente necessário, pois que com a morte do Cristo foi apagado! Ó feliz culpa, que mereceu tal e tão grande Redentor!
Ó noite verdadeiramente ditosa, que foste a única a conhecer o tempo e a hora em que o Cristo ressuscitou do sepulcro. É esta a noite da qual foi escrito: “E a noite será clara como o dia; e a noite será luminosa para me alumiar em minhas delícias.” A santidade dessa noite afugenta os crimes, lava as ofensas, restitui aos culpados a inocência e dá alegria aos tristes; extingue os ódios, restabelece a e submete os impérios a Deus.
Recebei, ó santo Pai, nesta noite sagrada, o sacrifício vespertino deste incenso, que a santa Igreja Vos oferece pelas mãos de seus ministros, com a oblação solene deste Círio, cuja matéria as abelhas forneceram. Já conhecemos, pois, a significação desta Coluna de cera; que, em honra de Deus, vai ser acesa pelo fogo rutilante.
Esta chama, embora dividida, não sofre diminuição alguma comunicando a sua luz porque se alimenta da cera que a mãe abelha produziu para composição deste precioso facho. Ó noite verdadeiramente feliz, que despojou os Egípcios e enriqueceu os Hebreus! Noite em que o céu se uniu à terra e as coisas divinas se uniram às humanas!
Nós Vos rogamos, portanto, Senhor, que este Círio consagrado em honra do vosso Nome, arda incessantemente para dissipar as trevas desta noite, e que a sua luz, evolando-se qual suave perfume, se misture com a dos luminares sidéreos. Aceso ainda o encontra a estrela da manhã, aquela estrela que desconhece ocaso, e que, surgindo de lugares sombrios, espargiu sobre o gênero humano a sua luz serena.
Nós Vos imploramos ainda, Senhor, que Vos digneis conceder a nós, vossos servos, a todo o clero e ao vosso devotíssimo povo, com o nosso santíssimo Padre, o Papa N., e o nosso Bispo N., uma paz completa nestas alegrias pascais, e que vos digneis com a vossa contínua proteção, nos reger, governar e conservar.
Olhai também para os que nos governam com seu poder e orientai, pelo inefável dom da vossa piedade e misericórdia, seus pensamentos para a justiça e a paz, a fim de alcançarem, depois das fadigas terrenas, com todo o vosso povo, a Pátria celeste.
Pelo mesmo Jesus Cristo, vosso Filho e Senhor nosso, que, sendo Deus, convosco vive e reina, na unidade do Espírito Santo, por todos os séculos dos séculos. R. Amém.
O diácono, terminada esta oração, tira a sua dalmática branca e, uma vez colocada a roxa, retorna ao lugar onde se encontra o Pontífice. Começam então as Profecias retiradas dos livros do Antigo Testamento.
IV – As Lições ou Profecias
Após um prelúdio tão solene, enquanto a tocha da ressurreição ilumina toda a igreja e alegra santamente os corações dos fiéis, começa a quarta parte da Vigília Pascal. Para completar o percurso instrutivo cujo desenvolvimento seguimos ao longo da Quaresma, lemos aqui algumas passagens da Sagrada Escritura, especialmente adaptadas a esta solene circunstância.
Como nas outras antigas Vigílias da Igreja Romana, as Lições desta noite eram em número de doze. Durante o período bizantino, elas eram até lidas em grego para o benefício dos ouvintes que não sabiam latim. Seu número foi posteriormente reduzido para seis, um número que ainda é usado hoje para o sábado das Quatro Têmporas, e até mesmo para quatro, como visto no Sacramentário Gregoriano e no primeiro Ordo Romano. Esse costume de fazer apenas quatro Lições foi preservado em certas igrejas, enquanto em outras, incluindo a de Roma, elas retornaram ao número de doze antes do final do século XII.
Durante esta Vigília, os sacerdotes realizaram os ritos preparatórios para o Batismo com os catecúmenos.
Neste momento, eles estavam reunidos no pórtico externo da igreja, enquanto os sacerdotes realizavam com eles os ritos preparatórios para o Batismo, todos eles carregados de profundo significado. Primeiro, eles traçavam o sinal da cruz na testa de cada pessoa; então, impondo as mãos sobre suas cabeças, ordenavam que Satanás deixasse aquela alma e corpo e desse lugar a Cristo. Seguindo o exemplo do Salvador, eles tocaram com sua saliva as orelhas e o nariz dos neófitos, dizendo aos seus ouvidos: “Abri-os”; e às narinas: “Respirem a doçura dos perfumes”; o neófito recebia então a unção com o Óleo dos Catecúmenos no peito e nas costas; mas antes desta cerimônia que o fazia parecer um atleta de Deus, o sacerdote ordenava que ele renunciasse a Satanás, à sua pompa e às suas obras.
Esses ritos eram realizados primeiramente em homens; depois, quanto às mulheres: seus filhos, mesmo os mais jovens, também eram admitidos a essa cerimônia, segundo o sexo de cada um, e, se entre os catecúmenos houvesse alguns doentes, e ainda assim quisessem ser levados à igreja para receber naquela noite a graça da regeneração, os sacerdotes pronunciavam sobre eles uma oração na qual pediam a Deus que se dignasse ajudá-los e confundisse a malícia de Satanás.
Esse conjunto de ritos, que era chamado de Catequese, demandava muito tempo devido ao grande número de candidatos ao Batismo. Por esta razão, o Bispo ia à igreja por volta da hora da Nona e começava a Vigília tão cedo. Para manter a assembleia atenta durante o tempo necessário à realização deste rito, eram lidas do alto do ambão as passagens da Escritura mais apropriadas a estas circunstâncias solenes. Este conjunto de lições completava o curso de instrução cujo desenvolvimento temos acompanhado ao longo da Quaresma.
Os catecúmenos são hoje menos numerosos do que antes e, além disso, com o retorno da cerimônia às horas noturnas, esses ritos preparatórios puderam ser realizados à tarde; por esta razão, para tornar mais leve esta parte da Vigília, atualmente não são lidas mais do que quatro lições. Elas são cantadas diante do círio pascal abençoado, no meio do presbitério, enquanto todos sentam e ouvem.
Após cada lição, o diácono, instrutor da assembleia litúrgica, convida todos a se ajoelharem em silêncio e rezarem em oração, na qual cada um expressa a Deus os sentimentos que a leitura sagrada produziu em cada um deles. Em seguida, ele ordena que ela se levante e o Bispo recolhe, “colecta” a oração de cada um na oração-coleta, na qual se expressa a própria Santa Igreja. Cantos retirados do Antigo Testamento e inspirados nas próprias leituras unem todas as vozes a modo de Tractos e, ao mesmo tempo que instruem, ajudam a manter o público mais atento. Com tudo isso, a reunião desta função oferece um aspecto de austera gravidade: ainda não chegou a hora tão esperada, em que Cristo ressuscitará nos seus neófitos.
V – A primeira parte das Ladainhas do Santos e a Bênção da Água batismal
Terminadas as lições, dois cantores, ajoelhados no meio do coro, entoam as ladainhas dos Santos, às quais todos, de joelhos, respondem até chegar à invocação Propitius esto.
Neste momento o canto é interrompido; no meio do coro, do lado da Epístola, é preparado um vaso contendo a água batismal a ser abençoada e tudo o que é necessário para a bênção; em seguida, o Bispo, ou celebrante, de pé, de frente para o povo, inicia a bênção na presença dos fiéis.
O Senhor esteja convosco.
E com vosso espírito.
Oremos.
Deus onipotente e eterno, olhai com benevolência para a devoção do vosso povo renascido, que, como o cervo, se dirige à fonte das vossas águas; e fazei que a sede da sua fé santifique, pelo sacramento do Batismo, o seu corpo e a sua alma. Por nosso Senhor. R. Amém.
A bênção da água para o Batismo é de instituição apostólica[20]; e sua antiguidade é atestada pelo testemunho dos maiores doutores, como São Cipriano, Santo Ambrósio, São Cirilo de Jerusalém e São Basílio. É justo, de fato, que esta água, destinada a ser o instrumento da maior das maravilhas divinas, seja cercada por tudo o que pode exaltá-la à face do céu e da terra, glorificando ao mesmo tempo a Deus que se dignou associá-la ao seu misericordioso desígnio para a humanidade. Os cristãos já saíram da água; eles são, como disseram nossos pais dos primeiros séculos, os peixes felizes de Cristo; não é de estranhar, portanto, que saltem de alegria na presença do elemento ao qual devem a sua vida e que Lhe prestem as honras que se referem de modo especial ao Autor deste milagre de graça. A oração que o Pontífice vai rezar para a bênção da água nos remete ao berço da nossa fé, pela nobreza e energia do seu estilo, pela autoridade da sua linguagem e pelos ritos antigos e primitivos com que é acompanhada. É feito em imitação de um prefácio solene e cercado por um lirismo inspirado. O Pontífice inicia com uma oração simples, após a qual a Igreja explode em entusiasmo, convidando-os a responder, alertando-os sobre como devem manter seus corações elevados: Sursum Corda.
ONIPOTENTE e eterno Deus, atendei a esses mistérios de vossa grande piedade, atende a esses sacramentos e enviai o Espírito de adoção para gerar novamente novos povos que nascerão na pia batismal, para que tudo o que realizamos em nossos humildes ministérios seja aperfeiçoado por vossa graça. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina, na unidade do Espírito Santo, Deus:
Por todos os séculos dos séculos.
Amém.
O Senhor seja convosco.
E com o vosso espírito.
Elevai os corações.
Assim os temos para o Senhor.
Demos graças ao Senhor, nosso Deus.
É digno e justo.
VERDADEIRAMENTE é digno e justo, necessário e salutar, que sempre e em todo lugar vos rendamos graças, ó Senhor, Pai Santo, onipotente e eterno Deus. Que com poder invisível, que operais admiravelmente nos efeitos de vossos sacramentos, e apesar de sermos indignos de administrar tão grandes mistérios, vós não nos recusastes os dons da vossa graça, antes vos inclinais favoravelmente às nossas súplicas. Ó Deus, cujo Espírito, no começo do mundo, pairava sobre as águas para comunicar a este elemento natural o poder de santificar. Ó Deus, que, lavando com a água os pecados do mundo corrompido, fizestes do dilúvio um símbolo da regeneração (batismal), tornando o mesmo elemento misteriosamente o fim dos vícios e a origem das virtudes. Olhai, Senhor, para a face da vossa Igreja, e multiplicai nela o número dos regenerados, vós que, com a torrente impetuosa de vossas graças, alegrais a vossa cidade e abris as fontes do Batismo em todo o mundo, para renovar os povos em todo o mundo; para que, pelo poder de vossa majestade, recebam de vosso Unigênito a graça do Espírito Santo.
Aqui o Pontífice para por um momento e, colocando as mãos na água, divide-as em forma de cruz, mostrando que pela virtude da cruz elas adquiriram o poder de regenerar as almas. Até a morte de Cristo na cruz, esse poder maravilhoso foi prometido somente a eles; para que fosse conferido, era necessária a efusão de sangue divino. Aquele sangue, que atua nas almas através da água com a virtude do Espírito Santo que o Pontífice invocará mais tarde.
Que esse Espírito se digne fecunda, por uma misteriosa união de sua graça divina, esta água preparada para a regeneração dos homens; de modo que, tendo concebido a santificação desta fonte divina, uma criatura renovada, uma raça celeste nasça em seu seio imaculado: e que a graça materna dê à luz a mesma infância a todos os que se diferem, ora corporalmente pelo sexo, ora temporariamente por causa da idade. Ordenai, ó Senhor, que todo espírito imundo fuja daqui; e que toda a influência maligna do diabo desapareça. Nenhum poder do inimigo interfira neste lugar, nem circule por ele, nem se esgueira furtivamente, nem corrompa essas águas com seu veneno.
Depois destas palavras, pelas quais o Bispo pede a Deus que se digne afastar destas águas a influência dos espíritos malignos, que procuram infectar toda a criação, ele estende as mãos sobre elas ao mesmo tempo em que as toca. O caráter augusto do Pontífice e do sacerdote é fonte de santificação; e o contato de sua mão consagrada já opera em si mesmo com sua própria virtude sobre as criaturas, quando o faz em virtude do sacerdócio de Cristo que reside nele.
Seja esta santa e inocente criatura a água, livre de todo ataque do inimigo, e purificada pela exclusão de toda malícia. Seja uma fonte viva, uma água regeneradora, onda purificante; de sorte que, todos os que hão de lavar-se neste banho salutar, consigam, pela operação do Espírito Santo, a graça de uma perfeita pureza.
Ao mesmo tempo em que pronuncia as seguintes palavras, o Bispo abençoa três vezes as águas da pia batismal, fazendo sobre elas o sinal da cruz.
Por isto te abençoo, criatura da água, pelo Deus ✠ vivo, pelo Deus ✠ verdadeiro, pelo Deus ✠ santo; por Deus, que no princípio, com sua palavra, te separou da terra, e cujo Espírito pairava sobre ti.
Ao chegar aqui, o Bispo, mostrando-nos as águas destinadas a fecundar o paraíso terrestre circundado pelos quatro rios, agora as divide com a mão e as estende em direção aos quatro cantos do mundo, que depois devem receber a pregação deste Batismo. Realize este ritual muito expressivo enquanto pronuncia as seguintes palavras:
O qual te fez brotar da fonte do Paraíso, e, dividida em quatro rios, te mandou regar toda a terra. O qual, convertendo-te de amarga em doce, no deserto, te fez potável, e te tirou de uma rocha para seu povo sedento. Aben✠çou-te, também, por Jesus Cristo, seu único Filho e Senhor Nosso, o qual, em Caná da Galileia, por um prodígio admirável de seu poder, te converteu em vinho. O mesmo caminhou sobre ti a pé enxuto, e em ti foi batizado por João, no Jordão. Ele te fez sair de Seu lado, misturada com Sangue; e Ele também mandou a seus discípulos que em ti batizassem aos que cressem, dizendo: “Ide, ensinai a todas as nações, batizando-as em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo”.
Neste ponto o Bispo interrompe o tom introdutório, em que vinha cantando até então, e pronuncia o seguinte em tom simples. Depois de selar as águas com o sinal da cruz, ele invoca sobre elas a ação fecundante do Espírito Santo.
E vós, ó Deus onipotente, assiste-nos com vossa bondade, no cumprimento deste vosso preceito; pela vossa benignidade, inspirai-nos.
O Espírito Santo tem um nome que significa Sopro; pois Ele é o sopro divino, aquele vento com força de furacão que se espalha pelo Cenáculo. O Pontífice manifesta este caráter da terceira Pessoa Divina soprando três vezes sobre as águas em forma de cruz; então continua sem ainda assumir o tom do Prefácio.
Com o sopro da vossa boca, abençoai estas simples águas, para que além do poder natural que tem para lavar os corpos, tenham também a eficácia para purificar as almas.
Em seguida, pega o Círio Pascal e mergulha a parte inferior na água. Este rito, que remonta ao século XI, é um símbolo do Batismo de Cristo no Jordão, o dia em que as águas receberam a garantia de seu poder divino. O Filho de Deus desceu ao rio, enquanto o Espírito Santo permaneceu acima de sua cabeça na forma de uma pomba. Hoje, não apenas a promessa é feita, mas a água verdadeiramente recebe a virtude prometida, através da ação das duas pessoas divinas.
Por isso, o Bispo, retomando o tom do Prefácio, canta o seguinte enquanto mergulha um pouco na água o Círio Pascal, símbolo de Cristo sobre o qual paira a Pomba celeste:
Desça sobre toda esta fonte a virtude do Espírito Santo.
Depois de cantar estas palavras, o Pontífice retira a vela da água e a coloca novamente um pouco mais fundo. E repetindo em tom mais alto:
Desça sobre toda esta fonte a virtude do Espírito Santo.
Pela terceira vez ele tira o Círio, colocando-o de volta no fundo da fonte, cantando a mesma coisa das duas vezes anteriores em um tom ainda mais alto:
Desça sobre toda esta fonte a virtude do Espírito Santo.
Desta vez, antes de retirar a vela da água, o Bispo se inclina sobre a pia batismal para unir em um símbolo visível o poder do Espírito Santo com a virtude de Cristo. Ele sopra novamente na água, não em forma de cruz como antes, mas traçando com sua respiração esta letra do alfabeto grego: Y, que é a primeira letra da palavra Espírito nesta língua. Então continue a oração com estas palavras:
E fecunde toda a água desta fonte, comunicando-lhe a virtude regeneradora.
O Círio é então completamente retirado da água e o Bispo continua:
Sejam aqui apagadas as manchas de todos os pecados; e a natureza, criada a vossa imagem e restabelecida a sua primitiva dignidade, seja aqui purificada de todas as imundícies do homem velho; de sorte que, todo homem que venha a este Sacramento da regeneração, renasça para uma nova infância de verdadeira inocência.
Então o Bispo diz o seguinte em tom claro:
Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que há de vir para julgar aos vivos e aos mortos, e destruir o mundo pelo fogo.
Após o povo responder Amém, um dos sacerdotes asperge o povo com água da pia batismal enquanto um dos clérigos enche um recipiente com água benta, que é destinada ao uso da igreja e à bênção das casas dos fiéis.
As orações da bênção da água terminaram; e ainda assim a Igreja não completou toda a cerimônia. Na última quinta-feira, usando os poderes que o Espírito Santo lhe concedeu, ela consagrou os Santos Óleos e agora deseja honrar a água batismal, espalhando estes Óleos cuja renovação foi recebida com tanta alegria. O povo cristão aprenderá assim a venerar sempre a fonte que confere a salvação aos homens e na qual estão incluídos todos os símbolos da adoção divina. O Bispo, tomando o frasco que contém o Óleo dos Catecúmenos, derrama-o na água, dizendo ao mesmo tempo estas palavras:
Seja santificada ✠ esta fonte se torne fecunda pelo óleo da salvação, para aqueles que renascem para a vida eterna.
Então, tomando o frasco do santo Crisma, ele o derrama na pia batismal, dizendo:
A infusão do Crisma de nosso Senhor Jesus Cristo e do Espírito Santo Consolador, se faça em nome da Trindade Santa.
Segurando o Crisma na mão direita e o Óleo dos Catecúmenos na esquerda, ele derrama ambos os frascos nas águas ao mesmo tempo e, terminando esta sagrada libação que manifesta a superabundância da graça batismal, ele diz:
Que a mistura do Crisma da santificação, e do Óleo da unção e a Água do batismo sejam também feitas igualmente em nome do P✠ai, do Fi✠lho e do Espírito ✠ Santo.
O Bispo espalha os Santos Óleos com a mão sobre a superfície da água para que toda inteira possa participar deste último grau de santificação.
Batismo – Uma vez benzida a água, pode-se conferir o Batismo; neste caso, é dado um sinal aos catecúmenos para que se aproximem do Bispo no meio do coro.
Nos primeiros séculos, o Batismo não era realizado no coro da igreja, mas no batistério, separado da igreja, e a cerimônia era realizada desta forma: a procissão ia em direção ao local onde estava a água; era um edifício separado da igreja e construído em formato circular ou octogonal. No centro há uma grande piscina que se sobe e desce por escadas.
Canais conduzem água pura até lá, que um cervo de metal esguicha de sua boca. Acima da fonte ergue-se uma cúpula; em cujo centro se destaca a imagem do Espírito Santo; abriam suas asas e como se estivessem fertilizando as águas. Uma balaustrada circunda a piscina para que o espaço fique livre para os batizandos e seus padrinhos e madrinhas, que são os únicos autorizados a entrar ali, juntamente com o Bispo e os sacerdotes. Duas salas eram erguidas a uma curta distância; um para homens e outro para mulheres; lá os recém-batizados se retiravam para se secarem e trocarem de roupa.
Aqui está a ordem da marcha em direção ao Batistério. O círio pascal, representando a coluna luminosa que conduziu Israel através das sombras da noite em direção ao Mar Vermelho, em cujas águas encontrariam a salvação, marcha agora à frente dos catecúmenos. À sua direita vão o padrinho dos homens e a madrinha das mulheres; pois eles foram admitidos à regeneração pela apresentação de um cristão de cada sexo, respectivamente. Dois acólitos carregam, um o Santo Crisma e o outro o Óleo dos Catecúmenos; seguindo o clero vem o Bispo com seus ministros. Esta procissão é iluminada pelo brilho das tochas, enquanto cantos melodiosos podem ser ouvidos no ar. Repetem-se as estrofes do Salmo em que Davi compara seus desejos aos da corça que anseia pela fonte. O cervo, cuja imagem foi colocada no Batistério, é a figura do fervoroso catecúmeno.
Eles se aproximavam um por um, os homens liderados pelo padrinho e as mulheres pela madrinha. O bispo fica em um supedâneo com vista para a fonte. O catecúmeno, tendo tirado as vestes superiores, desce os degraus da pia batismal e entra na água, conduzido pela mão do Pontífice. Elevando a voz, ele pergunta: “Crês em Deus Pai Todo-Poderoso, Criador do céu e da terra?” “Eu creio”, responde o catecúmeno. “Crês em Jesus Cristo, seu único Filho, nosso Senhor, que nasceu e sofreu?” “Eu creio”. “Crês no Espírito Santo, na Santa Igreja Católica, na comunhão dos santos, na remissão dos pecados, na ressurreição da carne e na vida eterna?” “Eu creio”. Depois da confissão de fé, o Pontífice pergunta-lhe novamente: “Queres ser batizado?” “Sim”, responde o escolhido. O Pontífice, estendendo a mão sobre a cabeça do catecúmeno, mergulha-o três vezes nas águas da pia batismal, dizendo: “Eu te batizo em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo.”
Três vezes o neófito desaparecia sob as águas. O Apóstolo nos explica esta parte do mistério. As águas foram para o escolhido o túmulo onde ele foi escondido com Cristo e, como Cristo, depois emerge com uma nova vida. A morte que ele acaba de sofrer é a morte do pecado; a vida que possui de agora em diante é a vida da graça. O mistério completo da ressurreição do Homem-Deus se reproduz no cristão batizado. Mas antes que este neófito deixe a água, uma cerimônia profunda completa nele a semelhança com o Filho de Deus. Jesus ainda estava nas águas do Jordão quando a pomba divina desceu sobre sua cabeça; antes que o neófito saia da pia batismal, um padre unge com o Crisma, o dom do Espírito Santo, a sua cabeça. Essa unção indica no escolhido o caráter real e sacerdotal do cristão que, por meio de sua união com Jesus Cristo, seu Chefe, participa, em certo grau, de sua Realeza e de seu Sacerdócio. Cheio dos favores do Verbo Eterno e do Espírito Santo, adotado pelo Pai que vê nele um membro do seu próprio Filho, o neófito sai da fonte pelos degraus do lado oposto, assemelhando-se àquelas ovelhas do Cântico divino, que sobem da piscina onde purificaram a sua lã branca[21]. O padrinho o espera na beira e lhe dá a mão para ajudá-lo a se levantar e, cobrindo-o com seu pano, enxuga a água que escorre por seu corpo.
O Bispo continua sua nobre função; quantas vezes um pecador é imerso nas águas, tantas vezes um justo renasce da fonte. Mas ele não pode exercer por muito tempo um ministério no qual os sacerdotes possam substituí-lo. Somente ele pode administrar aos neófitos o sacramento que deve confirmá-los pelo dom do Espírito Santo; e se, para exercer este poder divino, ele esperasse o momento em que todos os catecúmenos já estivessem regenerados, o grande dia chegaria sem que tivessem sido realizados todos os mistérios desta noite santa. Ele se limita, portanto, a administrar o Santo Batismo a alguns catecúmenos, homens, mulheres e crianças, e deixa aos sacerdotes o cuidado de recolher o resto da colheita do Pai de família. No Batistério há um lugar especial chamado Chrismarium, porque aqui o Pontífice deve administrar o sacramento do Crisma; retornar a este lugar e ascender ao trono que lhe foi preparado. Ele veste novamente os ornamentos sagrados que havia deixado para trás para descer à fonte; e imediatamente são colocados a seus pés os neófitos que ele acaba de batizar, e depois aqueles que são regenerados pelos sacerdotes. Ele dá a cada um deles uma vestimenta branca para usar até o sábado seguinte e lhes diz: “Recebam esta vestimenta branca, santa e imaculada; e levem-na ao tribunal de nosso Senhor Jesus Cristo e obtenham a vida eterna”. Recebido este símbolo eloquente, os neófitos retiram-se para as salas que foram preparadas no Batistério; deixam suas roupas molhadas, pegam outras e, com a ajuda dos padrinhos ou madrinhas, vestem por cima delas as roupas brancas que receberam do Bispo. Eles retornam ao Crismário, onde o Pontífice lhes administrará solenemente o sacramento da Confirmação.
A confirmação – Na quinta-feira, em meio às solenidades da consagração do Crisma, o Pontífice recordou a Deus que, quando as águas cumpriram seu ministério, purificando a terra, a Pomba apareceu no mundo renovado, levando em seu bico o ramo de oliveira que anunciava a paz e o reino d’Aquele que deu à Unção o nome sagrado que ela carrega para sempre. Nossos neófitos, também purificados na água, aguardam agora, aos pés do Pontífice, os favores da divina Pomba, sinal de paz de que a oliveira é símbolo. O Santo Crisma já foi derramado sobre sua cabeça; mas era apenas um sinal da dignidade à qual foram elevados. A partir deste momento, não significa somente graça, mas também obra nas almas; mas não está no poder do sacerdote administrar esta unção que confirma o cristão; é necessária a mão do Pontífice, de quem somente procede também a consagração do Crisma.
À sua frente estão os neófitos, os homens de um lado, as mulheres do outro, as crianças nos braços de seus padrinhos e madrinhas. Os adultos colocam o pé direito sobre o pé direito daqueles que serviram como pai ou mãe, significando por essa união a filiação da graça na Igreja.
Ao ver este rebanho reunido ao seu redor, o Pastor alegra-se em seu coração e, levantando-se do seu trono, exclama: “Desça sobre ti o Espírito Santo e a força do Altíssimo te guarde de todo pecado”. Em seguida, impondo-lhes as mãos, invoca o Espírito dos sete dons, a quem somente pertence o poder de assegurar aos neófitos as graças recebidas nas águas da fonte divina. Guiados pelos padrinhos, eles se aproximam do Pontífice, um após o outro, ansiosos por receber a plenitude do caráter cristão. O Bispo, tendo colocado o polegar no recipiente que contém o Crisma, marca cada um na testa com o selo indelével, dizendo: “Eu vos assinalo com o sinal da cruz e vos confirmo com o Crisma da salvação, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”. E dando-lhes um leve tapa no rosto, que era entre os antigos o sinal da alforria de um escravo, concede-lhes a completa liberdade de filhos de Deus, dizendo-lhes: “A paz esteja convosco”[22]. Os ministros do Pontífice envolvem a cabeça dos recém-confirmados com uma fita destinada a impedir qualquer contato profano com a parte da testa que foi ungida com o Santo Crisma.
O neófito deve guardar esta fita por sete dias, e deve deixá-la junto com a vestimenta branca que acabou de vestir.
Enquanto isso, em meio a esses mistérios, as horas da noite já passaram e se aproxima o momento de celebrar, com um sacrifício de alegria, o momento supremo em que Cristo sairá do túmulo. É hora do Pastor conduzir seu rebanho feliz, que aumentou tão gloriosamente, ao templo sagrado. É hora de dar a essas amadas ovelhas o alimento divino ao qual elas têm direito a partir de hoje.
As portas do Batistério se abrem e a procissão parte em direção à Basílica. O Círio Pascal, uma coluna de fogo, precede a multidão de neófitos. Os fiéis seguem o Pontífice e o clero, que entram triunfantemente na Igreja.
Durante o caminho, é cantado o Cântico de Moisés após a travessia do Mar Vermelho.
VI – Renovação das promessas do Batismo e segunda parte das Ladainhas
Uma vez concluída a bênção da água, é levada até a pia batismal. A procissão segue para lá cantando cântico “Sicut cervus”.
Trato – Como o cervo anseia pelas fontes de água; assim minha alma anseia por vós, meu Deus. V. A minha alma tem sede do Deus vivo. Quando entrarei para ver a face de Deus? V. Lágrimas eram o meu pão dia e noite, enquanto eles me diziam todo dia: Onde está o teu Deus?
Uma vez colocada a água na pia batismal, o celebrante, com as mãos juntas, diz em tom festivo:
O Senhor esteja convosco.
E com o teu espírito.
Oremos.
ONIPOTENTE e eterno Deus, olhai benigno para a devoção do povo que vai renascer, o qual deseja, como cervo, a fonte de vossas águas; e concedei-lhe por vossa bondade que a sede da mesma fé santifique sua alma e corpo pelo sacramento do batismo. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina, na unidade do Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos. R. Amém.
Ele então incensa a pia batismal, que todos devemos olhar e respeitar como algo muito sagrado e amado, como o ventre materno no qual renascemos para a vida eterna, e então todos retornam em silêncio ao coro.
O Bispo então toma uma estola e uma capa brancas, incensa a vela e, voltando-se para o clero e os fiéis, que têm suas velas acesas, dirige-se a eles, convidando-os a renovar as promessas feitas em seu Batismo. Todos se levantam e respondem:
CARÍSSIMOS irmãos: Recordando com amor a morte e a sepultura de Nosso Senhor Jesus Cristo, vigia esta noite, a Santa Madre Igreja; e cheia de alegria celebra a gloriosa Ressurreição do mesmo.
Pelo Batismo, porém, conforme ensina o Apóstolo, fomos com Cristo sepultados na morte; e assim como Cristo ressuscitou dos mortos, é preciso que andemos numa vida nova; sabendo que o nosso velho homem foi crucificado com Cristo, para não mais servirmos ao pecado. Consideremo-nos, portanto, mortos para o pecado, vivos, porém, para Deus em Nosso Senhor Jesus Cristo.
Por isso, irmãos caríssimos, terminados os exercícios da Quaresma, renovemos todos as santas promessas do Batismo, pelas quais outrora renunciamos a Satanás, às suas obras, e também ao mundo inimigo de Deus, prometendo fielmente servi-lO na Santa Igreja Católica. Portanto:
Celebrante: Renunciais a Satanás
?Todos: Renunciamos.
Celebrante: E a todas as suas obras?
Todos: Renunciamos.
Celebrante: E a todas as suas pompas?
Todos: Renunciamos.
Celebrante: Credes em Deus Pai todo poderoso, Criador do céu e da terra?
Todos: Cremos.
Celebrante: Credes em Jesus Cristo, um só seu Filho, Nosso Senhor, que nasceu e padeceu por nós?
Todos: Cremos.
Celebrante: Credes também no Espírito Santo, na Santa Igreja Católica, na comunhão dos Santos, na remissão dos pecados, na ressurreição da carne e na vida eterna?
Todos: Cremos.
Celebrante: Então agora, todos juntos, invoquemos a Deus, assim como Nosso Senhor Jesus Cristo nos ensinou a rezar:
Todos: Pai Nosso…
Celebrante: E que o Deus onipotente, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que nos regenerou pela água e pelo Espírito Santo, dando-nos a remissão dos pecados, guarde-nos ele próprio pela sua graça, em Nosso Senhor Jesus Cristo, para a vida eterna.
Todos: Amém.
E asperge o povo com a água benta que foi retirada da fonte, como dito acima.
Por fim, para concluir, conclui-se o canto da Ladainha dos Santos enquanto o Bispo vai à sacristia onde se veste com os paramentos sagradas, todos resplandecentes com o esplendor da Páscoa.
VII. A Missa Solene da Vigília Pascal
A Ladainha termina e os cantores agora chegaram à invocação que a conclui: Kyrie, eleison! O Pontífice avança da sacristia para o altar com a majestade dos dias mais solenes. À sua vista, os cantores prolongam a melodia das palavras de invocação e as repetem três vezes: Três vezes eles dirigem a invocação ao Filho de Deus: Christe, eleison!, e, finalmente, a invocação ao Espírito Santo: Kyrie, eleison!
Enquanto executam estes cânticos, o Bispo ou celebrante, juntamente com os ministros, vestidos com vestes brancas, aproxima-se do altar e, tendo feito a devida reverência e omitido o salmo e a confissão, aproxima-se dele, beija-o no meio e incensa-o como de costume. Desta forma a antífona chamada Intróito é omitida.
A Basílica começa a iluminar-se com as primeiras luzes do amanhecer. A assembleia dos fiéis, dividida em várias seções, os homens no corredor direito, as mulheres no esquerdo, acolheu os novos soldados em suas fileiras. Perto das portas, o lugar dos Catecúmenos está vazio; e nas naves laterais, nos lugares de honra, os neófitos são distinguidos com sua banda e com a vela acesa que seguram nas mãos. A incensação do altar terminou; de repente, ó triunfo do Filho de Deus ressuscitado! a voz do Pontífice entoa o hino angélico “Glória a Deus no mais alto céu e paz na terra aos homens de boa vontade”.
A estas palavras, os sinos, silenciosos há três dias, ressoam alegremente na torre sineira da Basílica; e o entusiasmo da nossa santa fé faz todos os corações baterem mais rápido. O povo continua com entusiasmo o cântico celestial e, uma vez terminado, o Bispo resume na seguinte oração os votos de toda a Igreja em favor dos seus novos filhos:
Coleta – Ó DEUS, que iluminais esta sacratíssima noite com a graça da ressurreição do Senhor, conservai nos novos filhos de vossa família o espírito de adoção que lhes destes, para que, renovados no corpo e na alma, vos prestem um santo serviço. Pelo mesmo Senhor Nosso Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina, na unidade do Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos.
Após a Oração Coleta, o subdiácono sobe ao átrio da Epístola e lê o trecho que o Apóstolo dirige aos neófitos no exato momento em que acabam de ressuscitar com Jesus Cristo.
Epístola – Leitura da Epístola de São Paulo Apóstolo aos Colossenses.
IRMÃOS: Se ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas lá do alto, onde Cristo está sentado à direita de Deus. Afeiçoai-vos às coisas lá de cima, e não às da terra. Porque estais mortos e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus. Quando Cristo, vossa vida, aparecer, então também vós aparecereis com ele na glória.
Depois desta breve leitura, cujas palavras encerram um significado muito profundo, o subdiácono desce do ambão e coloca-se diante do trono do Bispo. Depois de o saudar com uma profunda inclinação, canta com alegria estas palavras, que ressoam por toda a Basílica e despertam a alegria em cada alma: “Reverendíssimo Padre, trago-lhe uma boa notícia de grande alegria que é: Aleluia”.
O Bispo se levanta e canta alegremente o Aleluia. O coro repete Aleluia e esse grito celestial é trocado duas vezes entre o coro e o Pontífice. Neste momento toda tristeza passada desaparece; sente-se que as penitências da santa Quaresma foram aceitas pela Majestade divina e que o Pai dos séculos, pelos méritos de seu Filho ressuscitado, perdoa o mundo, pois lhe restitui o direito de ouvir o cântico da eternidade. O coro acrescenta este verso do Profeta real proclamando a misericórdia de Deus.
Confitemini – Louvai o Senhor, porque é bom; porque eterna é sua misericórdia.
Com tudo isso, ainda falta algo nas alegrias de hoje. Jesus saiu do túmulo, mas nesta hora em que nos encontramos, ele ainda não se revelou a todos. Somente sua Santa Mãe, Madalena e as outras santas mulheres o viram; esta tarde ele se mostrará somente aos seus apóstolos. Estamos no alvorecer da ressurreição, e é por isso que a Igreja canta os louvores do Senhor pela última vez na forma quaresmal do Tracto.
Tracto – LOUVAI ao Senhor todas as nações; louvai-o todos os povos. V. Porque ele nos confirmou sua misericórdia sobre nós, e a verdade do Senhor permanece para sempre.
Enquanto o coro canta este cântico de Davi, o diácono vai ao ambão, de onde fará ouvir as palavras do Santo Evangelho. Ele não é acompanhado pelos portadores das velas, mas sim pelo turífero com o incenso. Aqui está uma alusão aos eventos desta grande manhã. As mulheres foram ao túmulo com perfumes, mas a fé na ressurreição não brilhou em suas almas. O incenso nos lembra os perfumes, a ausência de velas significa que elas não tinham fé.
Evangelho – Continuação ✠ do santo Evangelho segundo Mateus.
DEPOIS do sábado, quando amanhecia o primeiro dia da semana, Maria Madalena e a outra Maria foram ver o túmulo. E eis que houve um violento tremor de terra: um anjo do Senhor desceu do céu, rolou a pedra e sentou-se sobre ela. Resplandecia como relâmpago e suas vestes eram brancas como a neve. Vendo isso, os guardas pensaram que morreriam de pavor. Mas o anjo disse às mulheres: “Não temais! Sei que procurais Jesus, que foi crucificado. Não está aqui: ressuscitou como disse. Vinde e vede o lugar em que ele repousou. Ide depressa e dizei aos discípulos que ele ressuscitou dos mortos. Ele vos precede na Galileia. Lá o haveis de rever, eu vo-lo disse. Eis o que vos anuncio”.
Após a leitura do Evangelho, o Pontífice não entoa o Credo. A Igreja o reserva para a missa solene que reunirá o povo fiel. Ela segue em cada um dos seus momentos as fases do mistério divino e deseja recordar neste momento o intervalo que ocorreu antes que os Apóstolos, que deveriam proclamar em toda parte a fé da ressurreição, lhe tivessem prestado homenagem.
Depois de saudar o povo, o Pontífice se prepara para oferecer à Divina Majestade o pão e o vinho que serão servidos no sacrifício; e em derrogação ao costume observado em todas as Missas o Ofertório não é cantado. Todos os dias esta Antífona acompanha a aproximação dos fiéis ao altar, quando apresentam o pão e o vinho que lhes serão novamente dados na Comunhão transformados no corpo e no sangue de Jesus Cristo. Mas a função é muito longa; se o ardor das almas é sempre o mesmo, o cansaço do corpo se faz sentir, e as crianças que jejuam para a comunhão manifestam com seus gritos o sofrimento que suportam. O pão e o vinho, materiais do sacrifício divino, serão fornecidos hoje pela Igreja e os neófitos não deixarão de sentar-se à mesa do Senhor, mesmo que não tenham apresentado o pão e o vinho.
Depois de ter feito a oferta e incensado o pão e o vinho preparado e depois o altar, o Pontífice resume os votos dos presentes no Ofício Secreto, a que se segue o Prefácio Pascal.
Secreta – RECEBEI, vos pedimos, Senhor, as preces de vosso povo com a oblação da hóstia, para que iniciados nos mistérios pascais, nos aproveitem, com vossa operação para remédio de eternidade. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina, na unidade do Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos.
Prefacio – VERDADEIRAMENTE é digno e justo, e igualmente salutar que Vos louvemos, Senhor, em todo o tempo e lugar, mas principalmente neste dia (ou nesta noite ou neste tempo), em que Cristo, nossa Páscoa, foi imolado. Porque Ele é o verdadeiro Cordeiro que tirou os pecados do mundo. Por Sua morte destruiu a nossa, e, ressurgindo, restaurou a nossa vida. E por isso, com os Anjos e os Arcanjos, com os Tronos e as Dominações e com toda a milícia do exército celestial, cantamos hinos à Vossa glória, dizendo sem fim: Santo, Santo, Santo, etc.
O Cânon começa e o mistério divino é resolvido. Nenhuma cerimônia é alterada até o momento que antecede a Comunhão. Há um costume, que remonta aos tempos apostólicos, de que os fiéis, antes de participarem do corpo e do sangue do Senhor, se cumprimentem com um ósculo fraternal, pronunciando estas palavras: “A paz esteja convosco”. Nesta primeira Missa de Páscoa, este costume é omitido. Na noite do dia de sua ressurreição, Jesus dirigiu essas mesmas palavras aos seus discípulos reunidos. A Santa Igreja, cheia de respeito pelas pequenas circunstâncias da vida de seu celeste Esposo, gosta de recordá-las em seus exercícios. Por esta mesma razão, o canto Agnus Dei, que data do século VII e que diz estas palavras na sua terceira repetição: “Dai-nos a paz”, é omitido hoje. Mas chegou o tempo em que os neófitos provarão pela primeira vez o Pão da vida e beberão a bebida celestial que Cristo instituiu na Última Ceia.
Inspirados pela água do Espírito Santo, eles sempre têm o direito de sentar-se no banquete sagrado; e o manto branco que os cobre mostra claramente que sua alma está adornada com a vestimenta nupcial exigida daqueles convidados para a festa do Cordeiro. Eles se aproximam do altar com alegria e respeito. O diácono lhes entrega o Corpo do Senhor e então lhes apresenta o cálice do Sangue divino. As crianças também são admitidas e o diácono, molhando o dedo no cálice sagrado, deixa cair algumas gotas na boca. Por fim, para significar que nestas primeiras horas do Batismo todos são “como crianças que acabaram de nascer”, como diz o Príncipe dos Apóstolos, depois da Comunhão é oferecido a todos um pouco de leite e mel, símbolos da infância e, ao mesmo tempo, da terra prometida pelo Senhor ao seu povo.
Feito tudo isso, o Bispo conclui as orações do Sacrifício pedindo ao Senhor o Espírito de paz entre todos os irmãos que a mesma Páscoa reuniu na participação dos mesmos mistérios. A mesma Igreja os carregou em seu ventre materno e a mesma fonte os gerou à vida; eles são membros do mesmo Chefe divino; o mesmo espírito os marcou com seu selo; o mesmo Pai celestial os adotou. Ao sinal dado pelo diácono, em nome do Pontífice, a assembleia se separa, e os fiéis, deixando a Igreja, retiram-se para suas casas, aguardando a hora do Santo Sacrifício para reuni-los novamente, para celebrar com ainda maior esplendor a Festa das festas, a Páscoa.
Laudes – Enquanto se manteve o costume de celebrar a Vigília Pascal à noite, a Vigília Pascal, que terminava ao amanhecer do domingo, não havia outro Ofício noturno ou matinal. Foi somente mais tarde, quando o costume de antecipar a Missa da Noite de Páscoa para a manhã do Sábado Santo foi introduzido, que a ideia de adaptar um Ofício de Vésperas foi considerada. Estando a manhã já completamente preenchida com os grandes ritos que já conhecemos, a Igreja decidiu adotar uma forma muito breve para este Ofício, imbuída daquele caráter alegre próprio depois de ter ouvido novamente o Aleluia. Estas Vésperas foram, portanto, organizadas de modo a formarem um só corpo com a Missa.
Agora que a Vigília Pascal foi restaurada, ela substitui as Matinas e Laudes da Páscoa, e a Igreja preservou apenas um resumo das Laudes, unidas à Missa, cuja ação de graças elas levam adiante, terminando com a oração da Pós-comunhão.
Assim, após a distribuição da Sagrada Comunhão no altar, canta-se no coro a seguinte Antífona e Salmo:
Ant. Aleluia, aleluia, aleluia.
Salmo 150
LOUVAI o Senhor em seu santuário, louvai-o em seu majestoso firmamento.
Louvai-o por suas obras maravilhosas, louvai-o por sua majestade infinita.
Louvai-o ao som da trombeta, louvai-o com a lira e a cítara.
Louvai-o com tímpanos e danças, louvai-o com a harpa e a flauta.
Louvai-o com címbalos sonoros, louvai-o com címbalos retumbantes. Tudo o que respira louve o Senhor!
Glória ao Pai, e ao Filho, e ao Espírito Santo.
Assim como era no princípio, agora e sempre, e por todos os séculos dos séculos. Amém.
Ant. Aleluia, aleluia, aleluia.
Nenhum outro salmo, capítulo, hino ou verso é cantado, mas o celebrante imediatamente entoa, para o Benedictus, esta antífona:
E muito cedo pela manhã, * no primeiro dia da semana, elas vão ao túmulo, ao nascer do sol, aleluia.
CANTICO
BEN✠DITO seja o Senhor, Deus de Israel, * porque visitou e libertou o seu povo.
E suscitou-nos um poderoso Salvador, * na casa de Davi, seu servo.
Como havia prometido pelos seus santos profetas, * desde os primeiros tempos;
Para nos livrar dos nossos inimigos * e das mãos de todos os que nos odeiam.
Assim exerce a sua misericórdia com nossos pais, * e se recorda de sua santa aliança;
Conforme o juramento que fez a nosso pai Abraão, * nos será dado,
Que, sem temor, libertados de mãos inimigas, * possamos servi-lo,
Em santidade e justiça, em sua presença, * todos os dias da nossa vida.
E tu, menino, serás chamado profeta do Altíssimo, * porque precederás o Senhor e lhe prepararás o caminho;
Para dar ao seu povo conhecer a salvação, * pelo perdão dos pecados.
Pela ternura e misericórdia de nosso Deus, * que nos trará do alto a visita do Sol nascente,
Que há de iluminar os que jazem nas trevas e na sombra da morte * e dirigir os nossos passos no caminho da paz.
GLÓRIA ao Pai, e ao Filho, e ao Espírito Santo.
Assim como era no princípio, agora e sempre, e por todos os séculos dos séculos. Amém.
Durante o canto do Benedictus, o celebrante incensa o altar e, depois de repetir a antífona e bem cedo pela manhã, ele canta a oração no altar:
Postcommunio – INFUNDI em nós, Senhor, o Espírito de vossa caridade, para que faças concordes em vossa piedade aos alimentados com os mistérios pascais. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina, na unidade do mesmo Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos.
Após a oração, o diácono, ao dar o sinal para os fiéis se retirarem, acrescenta dois Aleluia à forma ordinária e a mesma coisa é observada no final de todas as Missas até o sábado seguinte inclusive.
Ide, a Missa terminou, aleluia, aleluia.
Graças a Deus, aleluia, aleluia.
A Missa termina com a bênção do Bispo ou celebrante, omitindo-se a leitura do Evangelho segundo São João.
Tal é a solene função desta venerável e sublime Vigília Pascal, que quase nada perdeu no que diz respeito às suas orações e cerimônias, mas que precisava se aproximar, como já observamos, dos antigos costumes, para melhor recordar toda a sua grandeza e todo o seu significado.
[1] I Colossenses 1, 20.
[2] II Coríntios 5,21.
[3] Filipenses 2,7.
[4] Responsório VI do Ofício noturno.
[5] Provérbios 36, 18.
[6] I Coríntios 16,77.
[7] NOTA: “É conhecido que o ensinamento tradicional recorria à teoria do limbo, entendido como estado no qual as almas das crianças que morrem sem Batismo não mereciam o prêmio da visão beatífica, por causa do pecado original, mas não sofriam nenhuma punição, dado que não tinham cometido pecados pessoais. Essa teoria, elaborada por teólogos a partir da Idade Média, nunca entrou nas definições dogmáticas do Magistério, mesmo que o próprio Magistério a mencionasse no seu ensinamento até o Concílio Vaticano II. Esta permanece, portanto, uma hipótese teológica possível. Contudo, no Catecismo da Igreja Católica (1992) a teoria do limbo não é mencionada e, ao contrário, tem ensinado que, quanto às crianças mortas sem o Batismo, a Igreja só pode confiá-las à misericórdia de Deus, como, exatamente, faz no rito específico dos funerais para elas.” (Comissão Teológica Internacional: A esperança da salvação para as crianças que morrem sem batismo)
[8] Mateus 12,40.
[9] João 14,2.
[10] Mateus 12,29.
[11] A presença do Bispo, necessária para a administração do Sacramento da Confirmação, foi sem dúvida a razão pela qual Dom Guéranger colocou o Bispo como celebrante em toda essa função da Vigília Pascal, quando este poderia ter sido um simples padre.
[12] Esse uso do fogo novo parece ser de origem irlandesa.
[13] João 8, 12.
[14] Pedro 2, 6.
[15] Efésios 2, 20.
[16] Isaías 28,16.
[17] Ou celebrante; e entenda-se isto daqui em diante; exceto no parágrafo dedicado à Confirmação.
[18] Essa cerimônia é encontrada na Gália, na Alta Itália e na Espanha desde o final do século XV. O Círio pascal também é encontrado em Ravena, na época de São Gregório, e em Nápoles no século VIII.
[19] Exsultent divina mysteria tem sido um enigma e um tormento para os intérpretes. O Cardeal Schuster traduziu como “alegrem-se os mistérios divinos”; Dom Guéranger diz: “Celebrem-se com alegria os mistérios divinos”; Dom Capelle, abade de Mont César em Louvain, propôs corrigir Exsultent para Resulten e traduziu: “proclamem-se os mistérios divinos”; Dom Boniface Fischer, beneditino de Beuron, e Christine Mohrmann, professora da Universidade de Nijmegen, sustentam que a grafia correta neste caso é misteria com i latino; e misteria, como minsteria, é a forma vulgar de ministeria. Esta última acrescenta que em muitas línguas, e em latim Tácito, Tertuliano e outros testemunham, é muito comum usar um substantivo abstrato no sentido concreto, e isso acontece aqui: misteria (ministeria) é, em vez de ministri. Pois bem, os ministros de Deus, na linguagem bíblica e dos Santos Padres, são Anjos (Ephemerides liturgicae, 66 [1952] 274-281).
[20] Embora não possa ser confirmada por nenhum texto do Antigo Testamento, a bênção da água parece remontar ao final do século II. São Basílio a coloca entre as coisas não escritas mais transmitidas por “uma tradição tácita e secreta”.
[21] Cânticos 4,2.
[22] Antigamente, uma vez dita o “Pax tecum”, o Pontífice dava o ósculo da paz ao recém-confirmado. Mais tarde, por pudor, este ósculo foi substituído por uma carícia no rosto, que para certos simbolistas era sinônimo de bofetada, devendo o cristão estar preparado para sofrer por Cristo e com Cristo todas as ignomínias e sacrifícios. Para outros, recordaria a condecoração recebida pelos que eram condecorados cavaleiros na Idade Média, tornando assim o confirmado um soldado armado de Cristo.

