A SEXTA-FEIRA DA IV SEMANA DA QUARESMA

A SEXTA-FEIRA DA IV SEMANA DA QUARESMA
Ano Litúrgico – Dom Próspero Gueranger
A estação é celebrada na Igreja de Santo Eusébio, sacerdote romano. Ele viveu no século IV, e sofreu pela fé na perseguição dos arianos no tempo do imperador Constâncio. A igreja estacional estava situada no meio de um cemitério, fato que, provavelmente, influenciou na escolha das Leituras de hoje. Como ontem, vemos na Leitura e no Evangelho, a Deus e a Cristo, Senhor sobre a morte. Os batizandos e os penitentes estão mortos. Jesus Cristo lhes comunica a vida.
COLETA – Ó DEUS, que renovais o mundo por inefáveis Sacramentos, concedei, Vos pedimos, que a vossa Igreja prospere com as instituições eternas e não seja privada dos auxílios temporais. Por Nosso Senhor.
EPÍSTOLA – Leitura do primeiro livro dos Reis.
NAQUELES dias, o filho da mulher que hospedava Elias caiu doente, e o mal foi tão violento que veio a morrer. Então a mulher disse a Elias: “Que há entre nós, homem de Deus? Será que vieste à minha casa para relembrar meus pecados e fazer meu filho morrer?” Elias respondeu: “Dá-me o teu filho!” Então ele o tomou dos braços da mãe, e o levou ao quarto alto em que se hospedava e o estendeu no seu leito. Elias invocou o Senhor, dizendo: “Senhor, meu Deus, irás afligir até mesmo a viúva que me hospeda, fazendo-lhe morrer o filho?” Por três vezes estendeu-se sobre o menino, invocando o Senhor: “Senhor, meu Deus, eu te suplico; faze voltar ao corpo a alma do menino.” O Senhor ouviu a súplica de Elias, a alma do menino voltou ao corpo: estava vivo de novo! Elias tomou então o menino, desceu do quarto para a sala de baixo e o entregou à sua mãe dizendo: “Olha, teu filho está vivo!” A mulher respondeu-lhe: “Agora tenho certeza de que és um homem de Deus, e que a palavra do Senhor é verdade em tua boca.”
Ressurreição espiritual – Também hoje é uma mãe que vem desfeita em lágrimas, para pedir a ressurreição de seu filho. Essa mãe é a viúva de Sarepta, nós já a vimos representada como uma figura dos gentios. Em sua vida passada ela era uma pecadora, era uma idólatra e, portanto, a lembrança do passado a deixa inquieta; mas o Senhor, que a purificou e a chamou para ser sua esposa, a encoraja ressuscitando seu filho. A caridade de Elias é uma imagem do Filho de Deus. Observe como esse grande profeta é colocado no corpo do filho; como ele tenta se adaptar à sua medida, como o vimos fazer também Eliseu. Vamos também reconhecer aqui o mistério da Encarnação. Ele toca o cadáver três vezes e, por três vezes, mergulham-se os catecúmenos na pia batismal, invocando no ato os nomes das três pessoas da adorável Trindade. Na noite solene da Páscoa, Jesus dirá também à Igreja sua Esposa: “Olhe para os seus filhos dotados de nova vida”, e a Igreja cheia de alegria sentirá mais do que nunca a veracidade das promessas de Jesus. Os próprios pagãos os compreendem à sua maneira. Antes dos efeitos morais desse novo povo regenerado pelas águas do batismo, eles reconheciam que a divindade só poderia ser o princípio de tal virtude exaltada nos homens. No meio do Império Romano, dado a todas as paixões, uma raça pura e celestial apareceu e os filhos desta raça sagrada deram a última batalha para todas as aberrações pagãs. Onde eles aprenderam essa virtude? Na doutrina de Jesus e nos remédios sobrenaturais que se aplicam à degradação do homem. Então os fiéis correram em multidões desafiando o teste do martírio e a Igreja expandiu-se para acolher todas estas gerações que disseram com carinho: Nós reconhecemos que vós sois de Deus e vossa palavra é verdadeira, vindo de Deus.
EVANGELHO – Continuação do santo Evangelho segundo São João.
NAQUELE tempo, havia um homem doente chamado Lázaro, em Betânia, a aldeia de Maria e de Marta, sua irmã. (Maria, era a que derramara perfume sobre o Senhor e lhe enxugara os pés com seus cabelos. Seu irmão Lázaro é que estava doente. As duas irmãs mandaram dizer a Jesus: “Senhor, aquele que amas está doente.” A esta notícia, Jesus disse: “Esta doença não conduz à morte, mas para a glória de Deus, e para que o Filho de Deus seja glorificado!” Ora, Jesus amava Marta e sua irmã, e também Lázaro. Sabendo que ele estava doente, demorou, no entanto, dois dias onde se achava. Depois disso, disse aos discípulos: “Vamos de novo à Judéia.” Os discípulos disseram: “Rabi, ainda recentemente os judeus procuravam apedrejar-te, e tu voltas para lá?” Jesus respondeu: “Não há doze horas no dia? Aquele que caminha de dia não tropeça, porque vê a luz deste mundo; mas aquele que caminha de noite, tropeça, porque a luz não está nele.” Pronunciou estas palavras e acrescentou: “Lázaro, nosso amigo, adormeceu, mas eu vou despertá-lo.” Os discípulos disseram-lhe então: “Senhor, se dorme está salvo.” Jesus havia falado de sua morte, mas eles pensavam que falasse do sono. Então Jesus disse abertamente: “Lázaro está morto, e eu me alegro, por causa de vós, de não haver estado lá, para que acrediteis. Vamos para junto dele!” Tomé, chamado Dídimo, disse aos outros discípulos: “Vamos nós também, e morramos com ele!” Quando Jesus chegou, encontrou Lázaro há quatro dias no túmulo. (Betânia ficava perto de Jerusalém, cerca de quinze estádios.) Muitos judeus tinham vindo para junto de Marta e Maria, a fim de as consolar por causa do irmão. Logo que Marta soube da chegada de Jesus, correu ao encontro dele. Maria, porém, estava sentada em casa. Marta disse a Jesus: “Senhor, se estivesses aqui, meu irmão não estaria morto! E, no entanto, eu sei, tudo que pedires a Deus, Deus te concederá.” Jesus lhe disse: “Teu irmão ressuscitará!” Marta lhe disse: “Eu sei que ele ressuscitará na ressurreição, no último dia.” Jesus lhe disse: “Eu sou a ressurreição e a vida. Aquele que crê em mim, mesmo se houver morrido viverá. E todo aquele que vive e crê em mim, não morrerá para sempre. Crês isto?” Ela respondeu: “Sim, ó Senhor, eu creio que tu és o Messias, o Filho do Deus vivo, aquele que deve vir a este mundo.” Após ter falado assim, foi chamar Maria, sua irmã, e lhe disse baixinho: “O mestre está aqui e te chama.” Maria, logo que ouviu, levantou-se depressa e foi até ele. Porque Jesus não entrara ainda na aldeia; ele continuava no lugar onde Marta o encontrara. Ora, os judeus que estavam em casa com Maria e a consolavam, quando a viram levantar-se depressa e sair, seguiram-na, pensando que fosse chorar junto ao túmulo. Chegando ao lugar em que Jesus estava, Maria, logo que o viu, lançou-se aos seus pés e lhe disse: “Senhor, se estivesses aqui, meu irmão não estaria morto!” Quando ele a viu chorar, com os judeus que a seguiam e choravam também, Jesus estremeceu em seu espírito e perturbou-se. Ele disse: “Onde o colocastes?” Responderam-lhe: “Senhor, vem e vê.” E Jesus chorou. Disseram então os judeus: “Vede como ele o amava!” No entanto, alguns disseram: “Não poderia ele, que abriu os olhos ao cego, impedir que este morresse?” Jesus, estremecendo de novo em si mesmo, foi até o túmulo. Era uma gruta, fechada por uma pedra. Jesus disse: “Tirai a pedra.” Marta, a irmã do morto, disse: “Senhor, já cheira mal; há quatro dias que foi posto aqui!” Jesus replicou: “Não te disse que se tu creres, verás a glória de Deus?” Tiraram pois a pedra. Então Jesus ergueu os olhos ao céu, e disse: “Pai, eu te dou graças porque tu me ouviste. Quanto a mim, eu bem sei que tu sempre me ouves; mas, falo por causa da multidão que me acompanha, para que eles creiam que foste tu que me enviaste.” Depois disto, gritou com voz forte: “Lázaro, vem para fora!” Logo o morto saiu com os pés e as mãos amarrados com faixas, e o rosto envolto num Sudário. Jesus lhes disse: “Desamarrai-o, e deixai-o andar.” Muitos judeus que haviam vindo à casa de Maria e haviam visto o que Jesus fizera, acreditaram nele.
Lázaro, imagem do pecador – Leiamos confiantemente esta história admirável que nos diz a obra de Jesus nas almas. Lembremo-nos do bem que ele fez à nossa e prometemos-lhe finalmente ter compaixão pelos nossos penitentes que, numerosos em toda a terra, se preparam para receber o perdão que lhes devolverá a vida. Hoje não é uma mãe quem pede a ressurreição, são duas irmãs que imploram esta graça pelo amado irmão. A Igreja com este exemplo nos induz a orar por nossos irmãos. Mas sigamos a narrativa do nosso Evangelho. Lázaro esteve primeiro doente e moribundo, e finalmente morreu. O pecador começa deixando-se levar da preguiça à indiferença e depois recebe uma ferida mortal. Jesus não quis curar a doença de Lázaro: para tornar seus inimigos indesculpáveis, ele quer realizar um prodígio portentoso nos portões de Jerusalém. Ele quer provar como é senhor da vida para aqueles que, poucos dias depois, ficarão escandalizados com sua morte. No sentido moral, Deus às vezes permite que sua Sabedoria seja abandonada a uma alma ingrata, embora ele saiba que vai cair em pecado. Mais tarde, ele irá levantá-lo, e a confusão de sua queda, servirá para permanecer na humildade que o teria preservado. As duas irmãs, Marta e Maria, aparecem aqui muito diferentes do que eram por natureza, ambas desconsoladas, mas cheias de confiança. Jesus anuncia como Ele mesmo é a ressurreição e a vida; quem espera Nele não morrerá eternamente, porque é a única coisa que deve ser temida. Mas quando ele vê Maria chorando, cujo amor ele conhecia muito bem, ficou comovido e triste. Morte, castigo do pecado do homem, fonte de tantas lágrimas, move seu coração divino. Chegou ao túmulo que guarda o corpo de seu amigo Lázaro, ele chora, santificando assim as lágrimas que o amor cristão nos leva à beira do túmulo dos que amamos. Chegou a hora de levantar a pedra, para demonstrar em plena luz do dia o triunfo da morte. Já faz quatro dias que Lázaro estava no túmulo: é a imagem do pecador envelhecido em seu pecado. Não importa, Jesus não rejeita esse espetáculo. Com uma voz que abala qualquer homem e faz tremer o inferno, grita: Lázaro, saia e o cadáver salta da sepultura. A morte ouviu sua voz, mas seus membros ainda estão vestidos e seu rosto coberto, ele não pode se mover, seus olhos não veem. Jesus ordena que tire as ataduras, e a seu comando mãos humanas devolvem aos membros de Lázaro sua antiga liberdade e aos seus olhos a visão do sol. Esta é também a história do pecador reconciliado. Uma única palavra de Jesus teria sido suficiente para convertê-lo, tocar seu coração e induzi-lo a confessar seu pecado, mas Jesus deixa aos seus sacerdotes para desamarrá-lo, iluminá-lo e devolver-lhe o movimento. Este prodígio, operado nos dias em que nos achamos, exacerbou a fúria dos judeus. Este último benefício fez dele o alvo de sua raiva. De agora em diante ele não sairá mais de Jerusalém; Betânia, onde este milagre acaba de acontecer, não fica muito distante de lá. Nove dias depois, a cidade infiel contemplará o triunfo do Messias; então, ele retornará para a casa de seus amigos em Betânia, mas logo ele entrará na cidade novamente para consumar nele o sacrifício, cujos infinitos méritos são o começo da ressurreição do pecador.
Recordações históricas – Essa esperança consoladora foi a razão pela qual os primeiros cristãos multiplicaram nas pinturas das catacumbas a figura de Lázaro no momento de sua ressurreição; e esse tipo de reconciliação da alma pecaminosa esculpida igualmente no mármore dos sarcófagos dos séculos IV e V foi reproduzida até nos vitrais de nossas catedrais. Antigamente, a França honrou esse símbolo da ressurreição espiritual em um piedoso costume preservado na famosa abadia da Trindade de Vendome, até que nossas instituições católicas foram abolidas. Todos os anos, neste dia, um criminoso levado pela justiça humana foi levado à igreja da abadia. Ele usava uma corda em volta do pescoço e na mão segurava uma tocha que pesava trinta e três quilos, em memória dos anos do divino libertador. Os monges faziam uma procissão assistida pelo criminoso, bem como o sermão que se seguia. Depois o criminoso era, então, levado aos degraus do altar, ali o abade, depois de uma exortação, impunha como penitência a peregrinação a São Martinho de Tours. Então o cordão do pescoço era removido e ele estava livre. Este uso litúrgico, tão cristão e comovente, remonta aos tempos de Luís de Borbón, conde de Vendóme. Em 1426, durante seu cativeiro na Inglaterra, ele prometeu, se Deus devolvesse sua liberdade, estabelecer na Igreja da Trindade, em testemunho do reconhecimento deste tributo anual a Cristo que libertou Lázaro da sepultura. Os céus se apiedaram do príncipe e logo ele obteve a graça que ele solicitou com tanta fé.
ORAÇÃO SOBRE O POVO – Oremos. Humilhai as vossas cabeças diante de Deus.
CONHECENDO a nossa própria fraqueza, ó Deus onipotente, confiamos em vossa força e Vos suplicamos que possamos sempre nos alegrar com a vossa misericórdia. Por Nosso Senhor.

